24 de abr. de 2015

Para salvar um deus das fadas...

Mari'bel ainda meditava entre as árvores da floresta de Cormanthor que cercavam Myth Drannor, quando ouviu os passos de alguém. Esse alguém tinha passos leves, mas não fazia questão de disfarça-los. A guardiã killorien subiu rapidamente na árvore mais próxima. Dos galhos superiores avistou a elfa que vinha chegando e transmitiu a imagem para seus aliados.
- Kaliandra?... - Ela pensou reparando na semelhança da elfa que vinha com a que estava no palácio da cidade.
- Diga, Mari'bel... estou aqui buscando forças... - respondeu Kaliandra Boaventura pelo elo mental que unia todos ligados ao mythal.
- Está chegando aqui uma elfa, muito parecida com voc...
- Volcana! É minha tia Volcana Boaventura...
- Boaventura... - repetiu o bardo Sérgio Reis com deboche intrometendo-se no elo mental.
- É verdade... eu a reconheço agora... ela é uma serva de meu deus, Timothy Hunter, o senhor das fadas - Volcana já acenava pra Mari'bel. Sem mais se deter, a fada iniciada do arco deixou seu refúgio e reuniu-se à elfa de olhar amistoso e experiente.
- Olá, jovem killorien.. eu sou Volcana Boaventura...
- Eu sou Mari'bel da Grande Floresta, Volcana. Já nos conhecemos no reino de Timothy Hunter.
- É verdade, Mari'bel. Que o senhor das fadas sempre embale nossa alegria. É por ele que venho para cá...
- Eu não tenho sentido o deus das fadas, Volcana. E tive sonhos terríveis com Timothy e com a Grande Floresta... - a fada deixou escapar sem disfarces sua preocupação.
- As coisas por lá estão graves, mas há boa gente cuidando de remediar isso.. - sorriu com otimismo Volcana Boaventura. - Mas quem lidera a reconstrução de Myth Drannor? Tenho importantes orientações a dar...
- Uma parenta sua... Kaliandra Boaventura... minha aliada... - disse com orgulho Mari'bel mesmo tão preocupada.
- Sempre soube que essa menina iria longe... - Volcana abriu um largo sorriso e adentrou a cidade reconstruída.
Depois de caminharem por alguns minutos, as duas chegaram ao palácio onde ficara o mythal antes de fundir-se à cidade. Lá encontraram Kaliandra com sua nova espada da lua, além de Cameron, Dhyon e os outros elfos do séquito da trovadora da espada.
- Tia Volcana, meu coração fica feliz de recebê-la... - Kaliandra recepcionou a irmã de sua mãe com um abraço carinhoso, mas reparando que ela trazia um pesar disfarçado no semblante. Era como se tivesse vivido duas centenas de anos ao invés das quase duas décadas em que não se viam.
- E eu fico feliz de ver que você cresceu, minha querida, e está cada vez mais senhora de si e de seu destino... - disse Volcana beijando a testa da sobrinha.
- Esse é Cameron Noites, meu companheiro e pretendente. Aquele é Dhyon, clérigo de Bibiana, e aqueles são alguns outros seguidores da deusa que resgatamos. Desde que trouxemos de volta a força do mythal e o fundimos com a cidade, Myth Drannor se refez, se regenerou, e muitos elfos vem para cá. A corte, a rainha Amídalas Ancalimon estão vindo para cá.
- E chegarão em 3 dias... aqui estará então a verdadeira senhora desta cidade - interviu a elfa Katniss Everdoom saltando de seu grifo que pousou na entrada do palácio. - Eu sou a embaixadora da rainha que tem orientado as tropas e guiado os recém-chegados, enquanto a embaixadora Kaliandra tem se dedicado às suas demandas pessoais...
- Claro, claro, novinha... - desdenhou Volcana. - A questão é que a Grande Floresta está destruída e o deus das fadas, bem como todo o seu povo, foi vitimado por alguma maldição terrível.
- Mas quem fez isso? - Indignou-se Mari'bel sentindo o espírito de vingança oiriçar-se em seu íntimo.
- O chifrudo mal-cicatrizado desgramento de uma figa e a prostituta vingativa mal-comida das aranhas, se é que me entendem. Eles conseguiram atingir o âmago da Grande Floresta de alguma forma. Todos que estavam ligados a ela estão sentindo seus efeitos, quando não mortos, mas com a sorte de Tymora há como reverter isso.
- O que podemos fazer? - Desesperou-se Mari'bel.
- Timothy Hunter, desde que voltou a esse mundo e fundiu o reino das fadas à Grande Floresta, sabia quão arriscado e exposto era ser um deus no plano material. Por isso, ele enviou a mim e a nosso antigo companheiro, Etienne Navarre, junto com seu filho Tumling, para que preparássemos alternativas para eventuais problemas. Eu fui incumbida de encontrar um mythal caso algo acontecesse e usar sua energia para canalizar a volta dele - explicou Volcana.
- O mythal está cada vez mais forte... - disse Cameron.
- Mas Bibiana também não responde nossas preces... - acrescentou Dhyon.
- Você precisa se conectar a ele, Volcana.. - disse Kaliandra querendo parecer formal.
- Eu o farei. Mas para realizar o ritual.. precisaremos nós conectar às forças da natureza da Grande Floresta - explicou Volcana. - A energia de Timothy e das fadas está lá.
Mari'bel pensou no druida Chuck Norris, membro do círculo druídico mais importante daquela mata ancestral. Mas sabia que ele se perdera petrificado no aposento dos artefatos mágicos élficos, talvez destruído pelos sentinelas de pedra, por isso nada falou. Foi Volcana Boaventura quem prosseguiu:
- Nós precisaremos de uma fada - e ela sorriu para Mari'bel -, de um meio-elfo e de alguém que entenda muito de magia... e eu... bem... eu preciso de uma taverna e bebida...


Katniss Everdoom partiu em busca de alguém que tivesse sangue humano e élfico para realizar o ritual montada em seu grifo, já que não havia ninguém assim em Myth Drannor. Eram 129 elfos, 3 humanos, 1 hobbit, 1 fada, 1 corvo, 1 raposa e 1 drow. Enquanto isso, Volcana Boaventura pode ir para a taverna que Sérgio Reis instalara em uma das duas torres arcanas ,junto com os seguidores de Kaliandra, para se conectar ao mythal. Kaliandra, por sua vez, disse à tia que tinha assuntos mais delicados e foi com Cameron cuidar do drow que devia receber Bibiana em seu coração.
- Levante-se, rapaz... - disse Kaliandra em élfico. O jovem drow se levantou, mas nada respondeu. - Você pode me entender? Vim libertá-lo dessas trevas que acompanharam toda sua vida.. vim falar a você sobre a lei, a verdade e o caminho, irmão...
O drow continuou sério sem nada responder. Estava melhor alimentado e já sem nenhum ferimento.
- Graças à deusa Bibiana, não há mais drows ou elfos da superfície... não há mais verdes, do sol ou da lua... não há mais aquáticos ou terrestres... há apenas elfos... somos um só! - Kaliandra estendeu a mão amistosa para recebê-lo, enquanto Cameron permanecia vigilante da porta.
O drow se limitou a correr o dedo indicador da mão direita sobre o antebraço esquerdo apontando sua cor.
- Isso não será mais um problema... aceite Bibiana e verá que a cor da pele não será mais um problema, não nos diferencia mais - ela disse.
Ele sorriu e olhou para o quarto onde permanecia confinado. 
- Vivemos tempos delicados e você precisa entender a importância e a grandiosidade da oportunidade que tem... cabe a você abrir as portas dos elfos que viveram atormentados pela senhora das aranhas de que Bibiana chama o todos de seus filhos... assim você terá a benção do mythal e será aceito por todos, como deve ser, pois somos um só!
- Eu entendo suas... boas intenções... Kaliandra Boaventura... - o drow disse com um élfico perfeito. - Mas desejo antes falar com o poderoso arcano humano...
- Seus assuntos são com Bibiana, drow... - interviu de longe Cameron e o jovem drow lançou um olhar de sombracelhas erguidas para Kaliandra, que aceitou aquilo, fazendo sinal para que Noites contivesse seu ímpeto. 
Derdeil Óphodda surgiu um instante depois através de uma porta dimensional, trazendo consigo seu familiar, o corvo Edgar.
- Creio que um poderoso mago tenha sido aqui convocado... - disse o escolhido do deus da magia.
- Não precisamos de você... - desdenhou Cameron.
- Não foi o que ouvi... - debochou Derdeil.
- O elfo deseja lhe falar antes de aceitar Bibiana em seu coração - disse Kaliandra.
- Prefiro que falemos a sós... - acrescentou o drow.
- Não há nada que nós não... - discordou Cameron, mas Kaliadnra interviu.
- Vamos querido...
- O que você deseja? - Derdeil falou na língua que misturava sons e sinais dos drows.
- Eu desejo me aliar a você e não a esses fanáticos. Não sobrevivi aos horrores lá de baixo para isso. Lá embaixo, todos estão sendo transformados em mortos-vivos... todos que não as filhas da deusa das aranhas...
- Você pode aceitar Bibiana... - disse Derdeil sem demonstrar interesse. 
- E trocar um fanatismo pelo outro. Não quero ser o subjugado entre os subjugados... prefiro me associar a você...
- Eu sou o escolhido de Rhange Hesysthance Sorrowleaf, deus da magia. Se deseja me servir terá que se entregar em ritual para servi-lo!
- Nada de rituais... aceito você me entregar um livro de mandamentos, uma catequese ou mesmo um símbolo sagrado...
- Um símbolo? - Interessou-se Óphodda.
- Um símbolo sagrado... - disse o drow se aproximando como sinal de boa vontade.
- Ah sim.. eu tenho aqui um símbolo... - disse Derdeil pegando o amuleto em forma de mão com três dedos esticados e dois dobrados, símbolo sagrado do deus da magia. O mago o esquentou com uma magia e começou a queimar o corpo do drow, que gritou de dor ao receber a insígnia na carne.


Longe dali, mesmo bêbado. o monge Braad ouviu a discussão e resmungou contra Derdeil que lhe prometera uma tatuagem há muito mais tempo. Isso deixou de ser uma preocupação, quando ele, Sérgio Reis e Pena Branca avistaram a bela elfa que chegava à frente de uma comitiva de seguidores de Kaliandra.
- Então essa é famosa Volcana Boaventura... - disse Sérgio com um sorriso safado, lembrando-se das muitas histórias que cercavam o nome da barda harpista.
- E essa é a taverna local? - Disse Volcana Boaventura sacando uma garrafa de sua mochila. - Você deve ser o tal bardo Sérgio Reis...
- O grande Sérgio Reis, o cãozinho do berrante...
- Ouvi dizer que nada grande... - riu Volcana. - Diminuto até... Sérgio Reis, o caôzinho berrante foi o que eu ouvi...
- Errr... esse não é meu verdadeiro eu... - disse Sérgio Reis usando uma magia de alterar a si para tornar-se um humanoide medianamente dotado. - É só um disfarce para dar paz ao coração das mulheres...
- Bom truque.. - Volcana riu. - Conhece esse? Multiplicantis hidromelis... - e a garrafa de hidromel que ela trazia foi multiplicada cinquenta vezes.
- Puta que lo pariu!!! - Gritou Braad extasiado. - La murrer da mia vida! Una murrer que fabrica birita!!!
- Chega mais galera, temos uma festinha até a hora do ritual... - Volcana arrancou a rolha da garrada com a boca, cuspindo-a com talento em seguida.
- Xiiiii... que coisa... - murmurou o hobbit Rufus Lightfoot sentando-se e passando a desenhar em seu caderninho as cenas liberais da festividade bacante na taverna da torre.


- Ó senhor da magia e de tudo, pois tudo dela depende. Responda minhas preces... - Derdeil orou buscando conversar com Rhange Hesysthance. - Tomei as providências para cuidar da cidade do mythal e elfos seguem chegando. Vi em meus sonhos o triunfo retumbante da sua vontade sobre os deuses, assim como aquele escolhido do deus da tirania teme o nosso poder, meu senhor.
- Myth Drannor está segura por hora, mas deve cuidar para que nada amaldiçoe essa conquista, meu escolhido. - a voz do deus da magia soou na mente daquele que levava em si parte da força vital dele.  Desse modo, pelo elo mental, todos os outros também ouviram, embora os celebrantes da taverna não tivessem foco para aquilo. - As ameaças são constantes e usam de todos os subterfúgios.
- Quanto a isso... temos entre nós um drow... um prisioneiro dos elfos... e ele se oferece com servo para ti, meu senhor... assim como lacaio para mim...
- Aceite-o... temos cotas a preencher.. - concordou Rhange. - Mas não permita que se conecte ao mythal, pois isso pode ser do interesse da senhora dos drows.
- Assim será! - Derdeil estendeu a mão ao drow que ainda se contorcia de dor no chão. - Levante-se, lacaio. Você tem tarefas agora... e eu tenho um monge desmaiado pra tatuar.


Mari'bel retornou ao seu posto de meditação, mas não encontrou ali paz. Alguns minutos depois de começar a relaxar e comungar com a natureza, ouviu o incômodo barulho de pesadas armaduras metálicas. Logo viu os dois anões que discutiam rispidamente, enquanto avançavam desajeitadamente entre as árvores.
Ela desceu e tentou se comunicar com eles, mas as enormes discrepâncias entre a língua das fadas ou dos elfos e dos anões não permitiu. Os dois insistiam em mostrar uma moeda de ouro para logo depois fazerem poses exaltando seus músculos.  Um era careca e o outro tinha cabelo, mas no restante eram muito parecidos.
- Ma.. ri.. bel... - ela disse apontando para si mesma.
- Licurgo.. - disse o careca dando um cruzado de direita na face do outro anão.
- Leônidas... - disse o outro descendo o punho sobre a careca do primeiro. Logo os dois estavam rolando no chão como gladiadores teatrais.
A fada iniciada do arco desistiu e resolveu voltar para Myth Drannor, sendo informada do retorno de Katniss pelo elo mental. Os dois anões pararam a disputa e a seguiram, mesmo empurrando-se e resmungando um com o outro.


Katniss Everdoom voltou a Myth Drannor com uma meio-elfa que resgatara. Demorara algumas horas para ir até o sul, onde Cormanthor dava lugar aos vales e onde elfos e humanos tinham o costume de se misturar. Encontrou ali os exércitos de Sembia a sitiar os vales e seus habitantes.
Todos foram convocados e não demoraram a se reunir no palácio. Derdeil levou os que estavam na taverna da torre em uma porta dimensional, Braad, já tatuado com a cicatriz do símbolo de Rhange, além de Sérgio e Volcana.
- Aqui está Lilinea Luarte.. - disse Katniss apresentando a menina, que começava a deixar a infância e adentrar a adolescência. A garota tinha ferimentos e parecia fraca. - Foi quem eu consegui resgatar dos sembianos... eles estão em guerra contra o povo do vale...
- Eles estão a atacar também a floresta ao sul... - alertou Mari'bel.
- Malditos humanos mesquinhos... - protestou Cameron.
- Alguém querendo pagar pra ver uma boa briga? - Interrompeu um dos anões em sua língua, que Derdeil e Sérgio entendiam.
- Não temos tempo para isso.. - disse Derdeil usando seus poderes para curar Lilinea.
- Seu idiota.. - disse o segundo anão socando o primeiro.
- Precisamos iniciar o ritual.. - disse Volcana. - Não temos tempo a perder...
- É melhor que Mari'bel e a garota entrem nas águas do mythal... isso potencializará o ritual...
A killorien e a meio-elfa adentraram a água, sentindo os bons fluídos daquela água abençoada. Sem se preocupar com nada, os anões também entraram na água. Foi preciso uma moeda de ouro para tirá-los dali. O ritual prosseguiu por horas, tendo toda a cerimônia comandada por Derdeil Óphodda, que percebia o poder natural e primitivo da mais antiga floresta do mundo convergirem para o palácio.
Por um instante, o escolhido do deus magia sentiu o desejo por todo aquele poder, mas ele já não era obcecado com antes e liberou os canais para que o poder se derrama-se nos dois receptáculos. Toda aquela positividade ofuscou a todos brevemente, quase sendo demais para Mari'bel e Lilinea, mas graças ao equilíbrio e perseverança da fada, a energia manteve-se ali.

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