Yorgói pensou novamente em Deborah, o único pensamento que dava forças ao seu espírito para continuar existindo. Não era simples para ele suportar o tormento perpétuo de ser um prisioneiro daquele lorde diabólico. Enquanto as outras almas eram consumidas como cerveja barata ou utilizadas como combustível para os ataques que seriam lançados contra os Sete Céus, ele parecia ter alguma importância para o tal Orcus, senhor máximo de todas as hordas abissais e infernais. O mestre gnomo sabia que isso tinha alguma coisa haver com Rock dos Lobos. Pensou se não teria sido melhor ter permanecido em Águas Profundas lecionando magia para garotos riquinhos e cheios de espinhas ao invés de unir-se a um grupo de aventureiros destemidos. Pensou na confiança que Ehtur Telcontar sempre lhe transmitiu. Na pureza de Daphne da Grande Floresta. No amor sem tamanho de Úrsula e Arnoux Suarzineguer. Na nobreza de Ryolith Fox. Na sede de conhecimento de Rock. Lembrou-se até mesmo da simpatia ambivalente de Sirius Black. Querendo ou não haviam se tornado seus amigos.. talvez estivessem tentando salvar o mundo.. ou os mundos todos.. naquele exato momento. Tinha certeza de que era isso que estariam fazendo e que ele cantaria uma ótima canção sobre isso se estivesse vivo e livre.
Desde que morrera, não tinha mais noção do tempo e já podiam ter se passado muitos anos desde que aquela guerra sangrenta começara. Graças à cópia distorcida do jovem bárbaro que chamavam de Kcor, o vil e desprezível Orcus conseguira não só o controle sobre todo o Abismo, bem como conquistar os Nove Infernos. Yorgói pudera assistir de camarote os lordes diabólicos e demoníacos caírem de joelhos: Demogorgon, Graz'zt, Mephistopheles, Baphomet, Baalzebul e até mesmo Asmodeus.. centenas deles.. seres cuja existência ele sequer cogitara eram agora lacaios de Orcus. Isso fora suficiente para criar o maior exército de que a existência provavelmente tinha notícia. Havia seres ali que nem mesmo os mais completos compêndios da Fortaleza da Vela deviam ter registro. Embora o caos imperasse naquele exército, este avançava como um tsunami pronto a varrer o que quer que houvesse pela frente.
A alma de Yorgói Dossantis seguia presa na gema esmeralda do cetro do senhor de todos os diabos e demônios de onde tinha uma visão privilegiada de tudo. Ele viu os lordes diabólicos e demoníacos se curvarem um a um ante o poder de Orcus e agora atuarem como seus generais submissos. Apenas Asmodeus permanecia aprisionado, empalado pelo próprio cetro aumentado enormemente, numa agonia perpétua que lembrava a todos do que Orcus era capaz. E Yorgói sabia que o malévolo e diabólico ser ambicionava muito mais. Havia ali também um segundo prisioneiro, cuja fama e poder o mestre gnomo conhecia e adimirava. Elminster Aumar, que fora aprisionado por um certo Nergal, mais um dos antigos lordes que agora servia à nova ordem. O escolhido de Mystra jazia inerte acorrentado ao chão como era próprio dos prisioneiros materiais desse plano. Todo o tempo era sugado fogo prateado de seu corpo.. magia em estado bruto... como Yorgói vira sair de Leila Diniz. Essa força primordial alimentava incontáveis larvas que deslizavam sobre o corpo do maior arquimago de Faerun.
Yorgói viu quando Kcor abriu o derradeiro dos portais sugando as almas que formavam um imenso pentagrama ao seu redor. Ele via ali bebês que sequer tinham tido o prazer de gozar a existência e agora eram consumidas antes de gozar a eternidade, deixando para trás pouco mais que o soluço de um choro. A passagem que se abria era colossal como o mar, vasta como as profundezas do oceano sem fim. O bárbaro de sombras expelia energias tenebrosas capazes de espalhar medo mesmo entre aqueles seres de pura maldade.
- Avancem minhas crianças de fogo e enxofre. Devorem a luz e a paz que nos fez refém do sofrimento pela eternidade. Hoje nosso banquete será frango assado, galinha ao molho pardo e pavão a passarinho. Não restará um anjo vivo ou celestial brilhando quando terminarmos. Hoje as Guerras Sangrentas findarão com o doce sabor de nossa vitória e não haverá mundo que não pilhemos, estupremos e governemos!!!
As tropas marchavam pelo amplo portal aberto com a força das almas ceifadas nas Planícies Cinzentas. Seus tambores e gritos entoavam o fim dos Sete Céus. Sozinho, sem que ninguém pudesse ouvi-lo, o bardo cantou uma triste canção que sua mãe lhe ensinara quando do falecimento de seu pai. Não parecia haver razão para esperança. Do outro lado, via-se um resplandecente céu azul sem nuvens onde um sol vistoso brilhava. Um longo paredão de anjos em armaduras prateadas aguardavam prontos a se sacrificarem pelos Sete Céus. Não havia esperança em seus semblantes.. apenas uma resignação convicta. O tempo parecia parado naquelas colinas de ferro.
A verdadeira surpresa se deu quando Kcor, num piscar de olhos, simplesmente desapareceu e com ele, o portal. Algumas poucas centenas de monstros haviam cruzados, enquanto outros passaram a se destruir ante a frustração da investida. Yorgói percebeu que aquilo não estava nos planos de Orcus e no fundo soube que seus amigos tinham alguma coisa haver com isso. Sorriu, pois sempre devia haver esperança...
Nobres amigos, por mais que nosso trabalho pareca infrutífero ante a majestade da tarefa não desistamos. A força que nossa convicção cria e a sinceridade de nossos corações emana é o suficiente para mover céu e terra, romper as muralhas dos inimigos. Vamos indo que um ano novo começou despercebido em meio ao desespero de nossa gente. O futuro será brilhante e nossos filhos sequer saberão a dor que seus pais sentiram.
ResponderExcluirYorgói!! Yorgói!! Meu coraçao resplandece em luz pensando q vc irá retornar a nós!!!
ResponderExcluirE que lindas palavras Chico!!