9 de ago. de 2012

Mocinhos e bandidos...


Sirius Black acordou ainda acomodado atrás da caixas. A carroça estava parando. Já era fim do dia e havia muitas outras carroças lá fora. Pelo barulho dos arredores, estavam em uma cidade. Com a mesma discrição com que encontrara seu esconderijo, Sirius deixou a carroça disfarçado com as roupas que encontrara e improvisando um turbante. Ele circulou apenas ouvindo línguas estranhas e estrangeiras aos seus ouvidos. Demorou um bocado até encontrar um mercador com quem falar nas línguas do oeste. Soube que estava em uma cidade que não passava de um entreposto para as caravanas. Ali, com muita mímica e boa vontade do comerciante, ele conseguiu trocar uma das espadas élficas que coletara por um par de adagas mágicas, uma das quais parecia nefastamente poderosa.
Depois disso, o servo de Máscara retornou à estrada. Ele analisou as caravanas que chegavam vindas do norte. Não havia caravanas partindo com a chegada da noite, mais uma vez sem lua e estrelas. As que chegavam do norte traziam os escravos de pele escura. As caravanas que vinham do sul traziam caixotes de grãos, tecidos e manufaturas. Sirius usou de seus poderes para invadir o interior de uma das carroças. Lá dentro encontrou um guarda e cinco escravos, sendo uma senhora de idade e quatro crianças.
Todos ficaram surpresos com o inesperado visitante que emergiu da escuridão. Como o carcereiro não entendeu patavinas do que dizia Sirius "a sombra da sombra" Black, este viu-se obrigado a silenciar aquele, o que foi reverenciado com louvor pelos escravos, que rapidamente se puseram a agarrá-lo. Sirius repetiu o nome Thesk.. isso bastou para os garotos apontarem uma direção. Com isso, Sirius Black, juntamente com pobres escravos, que já lhe parecia rotineiro libertar, mergulharam no plano das sombras.



Ainda longe dali, Bibiana despertou sentindo-se fraca e dopada. Sua cabeça latejava e seus músculos estavam amolecidos como se estivesse envenenada. Demorou algum tempo até ela ver alguma coisa naquela penumbra. Tinha as mãos amarradas atrás do corpo e a boca amordaçada. Pode enxergar alguém caído alguns poucos metros à sua frente.. Yorgói, o bardo gnomo. Via também muitos pés, até que o dono de um par deles abaixou-se próximo ao seu rosto:
- Veja só quem acordou.. bom dia, flor do dia.. ou melhor.. boa noite, escrava pro açoite.. - disse o sujeito com uma risadinha, puxando-a e colocando-a de pé. A serva de Corellon Larethian logo reconheceu Radamanthys Notívago e seus comparsas sombrios. Eram cinco além do líder, um dos quais portava a única tocha que trazia alguma luz àquele ambiente familiar. Ela não demorou a perceber que estava de volta à fortaleza onde Guideon fora morto.
- Você deve imaginar porquê está aqui, clériga. - ele disse retirando-lhe a mordaça.
- Minha mente não se envolve na sordidez dos pensamentos vossos, assassino.
- Ora, ora, quanta fúria. Não precisamos ser tão agressivos, não é mesmo? Afinal de contas, nós fomos muito longe para recuperá-la. Não é sempre que colocamos nossas mãos numa elfa tão bonita. Sem você nós não poderíamos terminar o grande ritual em homenagem a Máscara que derramará seu poder sobre o mundo.
- Ritual para Máscara? E o que diabos eu tenho haver com isso? - como resposta, Radamanthys se aproximou e mexendo nas coisas da meio-elfa, retirou dela uma pequena caderneta de capa de couro cru, o diário do irmão de Guideon, que haviam encontrado quando estiveram aqui da primeira vez. Ela nem se lembrava o motivo de ter mantido aquilo, onde puderam ler as desventuras de Hamish McLought. Quando ele o abriu, no entanto, ela viu o brilho acinzentado que se derramou daquelas páginas como se fosse de um tomo mágico.
- Eu realmente fiquei preocupado quando vocês escaparam com isso aqui... - disse o bandido com um sorriso maquiavélico. - Obviamente, nós não precisamos apenas do livro. Essas palavras precisam ser lidas por uma pessoa de boa índole e intenções, para que o portal para o reino de Máscara se abra e sua graça sombria nos cubra de poderes. Eu adoraria poder ler isso aqui, deve ser uma experiência e tanto, mas me falta o estudo.. nunca fui um aluno muito aplicado. Mas tem coisas que não se aprende na escola, não é mesmo?
- E o que o faz pensar que eu ajudaria alguém como você? - indagou Bibiana com toda a confiança que as causas justas alimentam nos indivíduos. Radamanthys Notivago, no entanto, não respondeu com palavras. Ele fez um sinal para um de seus homens, que prontamente abaixou-se sobre o gnomo, tomou uma de suas mãos e com um só movimento, cortou fora o dedo mindinho, arrancando gritos agoniantes de dor de Yorgói. O pobre gnomo mesmo amarrado se contorcia como um peixe fora da água.
Bibiana não estava pronta para aquele grau de crueldade, mas teve que pensar rápido, pois não sabia nenhuma prece que não dependesse dos gestos e ainda tinha as mãos presas. - Tudo bem.. tudo bem. Eu.. eu ajudarei.. mas.. eu preciso ter as mãos soltas.. eu preciso segurar o livro...
- Você acha que eu sou idiota?.. Eu seguro o livro pra você.. - Radamanthys disse jogando-a no chão.
- Mas é um ritual complicado e...
- Nós cuidaremos do ritual.. e você da leitura...


Muito ao sul dali, o grupo que avançara para Thay acabou vendo-se obrigado a lutar contra os cadáveres dos gnolls que haviam derrotado. Perceberam que não poderia haver descanso naquelas terras macabras. Após derrubar o último zumbi partiram e mantiveram-se em movimento, contornando e desviando de todos os pequenos grupos que acabavam cruzando seu caminho. Apenas Francisco e Leila foram dormindo no lombo de David, que fez um esforço extra para garantir que os magos recuperassem seus poderes.
Junto com o novo dia, veio também uma cidade às margens do enorme lago e aos pés do colossal paredão de pedra que barrava uma visão do horizonte. Um enorme planalto se anunciava para além da vista com uma imponência desconhecida mesmo para exploradores da grandeza da natureza como Ehtur, Daphne e Samwise. Verdade é que todos sentiam falta das palavras amistosas de Yorgói e nem todos da confiança eloquente de Sirius.
Com o dia que começava, caravanas já deixavam a cidade e navios partiam do porto. Daphne avistou do alto a grande quantidade de escravos que iam em direção ao outro lado do lago. Nas carroças que seguiam viagem iam grandes quantidades de grãos, produtos manufaturados em grandes caixotes. O povo da cidade já ganhava as ruas, embora a localidade contasse com pouco mais do que 4 mil habitantes, protegidos por muros um tanto baixos, mas que limitavam a duas as entradas: uma por onde partiam as caravanas e o porto. Ela via guardas nas ruas, um grande número de escravos e alguns mortos vivos circulando no povoamento pouco expressivo. Não haviam pessoas de vermelho, ela apenas vira humano com manto escarlate sobre um grifo até agora.
Resolveram entrar com cuidado e discrição. Ehtur, Úrsula e Samwise se fizeram invisíveis com os anéis que portavam. Daphne metamorfoseou-se em um humano parecido com a etnia dominante local, ainda que com veste simples que puderam improvisar. Leila, Francisco e Rock seriam seus escravos. O jovem bárbaro inclusive fingia carregar a "carcaça" de um lobo morto. Com isso em mente, seguiram, tendo os colegas invisíveis um pouco mais atrás. Ehtur se posicionou atrás de Daphne para qualquer eventualidade.
Conseguiram passar do portão que guardava a entrada. Miravam o porto, mas logo perceberam que estavam chamando alguma atenção. Demorou muito pouco para que um guarda abordasse Daphne numa língua estranha, que nem mesmo o poliglota Ehtur conhecia. Seguiu-se uma discussão de surdos e o disfarce parecia prestes a desmoronar. Quando o guarda usou a língua do reino de Aglarond, foi um alívio. Mas ele insistia que deveriam acompanhá-los até o prédio da guarda local. A recusa e resistência acabou realçando a desconfiança dos guardas que começavam a escutar os cochichos próximos ao "dono de escravos".
Sem paciência para aquilo e temendo o pior, Rock, "o andarilho dos planos", clamou pelos espíritos de seus ancestrais. Isso paralisou os guardas e também seus aliados, criando enorme tumulto, como já acontecera antes. Se a população corria em pânico, os guardas logo se puseram a atacar a todos, mesmo estando baqueados. Como eram apenas cinco, não pareciam verdadeira ameaça.
A verdadeira ameaça foi a bola de fogo que explodiu sobre eles. Demoraram algum tempo para se recuperar até verem que a magia viera do céu, onde um mago de vermelho montado em um grifo pairava. Leila e Francisco tentaram escapar montados em David, vendo que mais guardas vinham da frente. Ehtur, Úrsula e Samwise tentaram seguir o mesmo caminho rumo ao porto, enquanto Daphne se transformava em uma águia gigante para ir contra o mago vermelho, que paralisou o bárbaro com uma magia. E mais magos vieram, mais magias se seguiram, suficientes para tombar Ehtur e Daphne.
Vendo que tudo parecia perdido, Francisco "o necromante branco" Xavier arriscou uma jogada desesperada. Enquanto Leila "em busca da memória perdida" Diniz conjurou um poderoso leão celestial, ela e seu protetor recuaram agarrando os corpos do bárbaro e da druida, teleportando-se em seguida com eles, mas deixando o lobo para trás. David correu o mais rápido que pode, agarrando o caído guardião como pode. Enquanto isso, Úrsula e Samwise aproveitaram para montar ainda invisíveis no lobo selvagem. que conseguiu escapar parecendo levar apenas um cadáver. Todos dirigiram-se para o ponto afastado onde haviam combatido os gnolls, esperando que lá tivessem a segurança necessária para pensar melhor no que fazer.


Em Cormyr, Ryolith Fox e John Falkiner viajaram por um dia rumo ao norte assistindo as mazelas que a guerra e a fome traziam ao reino: um povo aterrorizado, terras desoladas, uma nação em frangalhos. Ryolith despedira-se de Palas Atenas lamentando não poder contar o real motivo de sua partida. Pelo fim do dia já avistavam as trevas que cobriam a antiga cidadezinha de Tilverton. O paladino de Tyr já vira aquela cena em seus sonhos, mas isso não diminuía o impacto do momento. Ele sentia a maldade que emanava daquele lugar sem sequer recorrer aos poderes com que Tyr lhe abençoara. Falkiner disse que havia muita energia negativa e que deveriam haver muitos mortos-vivos por ali, era certamente um lugar amaldiçoado. Ambos teceram preces aos seus deuses e seguiram viagem com um certo pesar em seus corações.
No dia seguinte, após uma noite sem lua e estrelas, sem sonhos, eles tomaram a direção noroeste em busca do Anauroch, o grande deserto. Aos poucos o terreno e o clima foram se tornando cada vez mais áridos e inóspitos. O solo pedregoso revelava que chegavam as Terras de Pedra, região limítrofe entre o reino e o maior deserto do mundo. Haviam andado pouco ainda quando avistaram um grupo de gnolls atacando dois humanos, que pareciam cativos, presos e maltratados como escravos.
Um ataque rápido e esmagador deu conta dos monstros, derrubando uns e imobilizando outros. Ryolith e John viram que os homens era beduínos nômades do deserto, que ficaram extremamente gratos a eles.
- Eu também fui um escravo certa vez.. - disse Ryolith curando os ferimentos deles. - Um homem de seu povo foi escravo comigo.. chamava-se Pereirão. Fomos capturados por um bandido chamado Sirius Black.
- O grande khar Pereirão? Ele é um dos mais destemidos guias de nosso povo nesse momento terrível!
- O que houve? - interessou-se John, que dera as magias para que pudessem entender uns aos outros.
- O povo das trevas chegou. Primeiro roubaram nossas terras, depois roubaram nossos sonhos e, por fim, roubaram a lua e as estrelas. Escravizam nosso povo e alimentam os homens-hiena e orcs. Eu sou Elair e este é Thela. Seremos eternamente gratos por vossa ajuda.. pede a honra que lhes paguemos na mesma medida.
- Somos gratos, mas não nos devem nada. A justiça de Tyr busca consolar a todos..
- Assim como Kelemvor deseja um descanso eterno justo para cada um.
- Ainda assim, estamos em débito com vocês...
- Talvez possam nos orientar em nossa jornada.. nós estamos em busca de uma cidade.. - disse Ryolith.
- Uma cidade perdida no deserto... - acrescentou Falkiner.
- Então nós sabemos onde devemos levá-los. - disseram os beduínos satisfeitos em poder ajudar.


Quando Sirius Black emergiu das sombras, muitas horas depois, já avistava a fortaleza ao longe. Ao seu redor, no entanto, as crianças gritavam aterrorizadas enquanto arrastavam-se para longe daquele estranho sujeito. A mulher jazia caída e esparramada no chão. Sirius vendo a tensão da situação, tomou uma de suas adagas e deu na mão do menino mais velho.
- Agora você é um homem, garoto. Com essa arma, você será um homem. - ele encarava o garoto no fundo dos olhos lacrimejantes. O menino tremia e tão logo o servo de Máscara o soltou... o menino desembestou correndo sem parar. Vendo o pequeno erro que cometera, Sirius tomou outra adaga e agarrou o segundo mais velho dentre os garotos. - Agora você é um homem, garoto. Com essa arma.. você irá proteger os outros dois, entendido?
- Si.. si.. sim.. se.. senhor... - e assim ela partiu, deixando os meninos à própria sorte, mas armados, enquanto rumou para a fortaleza.
Sirius "a sombra da sombra" Black avistou um sentinela no alto da fortaleza e imaginando já ter sido visto, acenou, transportando-se em seguida para próximo do guarda. Este realmente já esperava por ele e após um rápida troca de gentilezas que beiravam à ameaça, Sirius mergulhou nas sombras para surgir dentro da fortaleza.
Lá dentro, numa sala mais reservada, Bibiana foi novamente levantada, quando todo o ritual parecia pronto. Ela havia conversado com Yorgói, que recuperado do choque e tentando racionalizar a situação, dissera para que ela nada fizesse, não colaborasse, mesmo que isso significasse a morte dele. Bibiana "a sacerdotisa mestiça" Crommiel concordou, mas ela tinha outros planos.
Quando Radamanthys Notívago aproximou-se com o livro brilhante, ela procedeu à leitura, muito embora reafirmando a dificuldade de lídar com aquele dracônico arcaico sem o uso das mãos. O homem das sombras concordou em deixar-lhe as mãos livres, mas estava alerta para qualquer gracinha. Ainda assim, Bibiana achou que não perceberiam o círculo de proteção contra o mal que ela conjurou. A resposta de Radamanthys foi a lâmina da rapier que perfurou o abdômen da clériga. O sangramento que se seguiu era contínuo, ininterrupto, roubando-lhe a vida..
- Tente outra gracinha dessa e meu próximo alvo será o seu pescoço..
- Chefe.. - disse um dos subalternos surgindo das sombras e fazendo estranhos sinais. Radamanthys pareceu entender e deu ordens para que três de seus homens seguissem, restando outro dois ali com ele.
- Continue lendo.. - ele colocou a lâmina no pescoço de Bibiana, assim como um de seus homens fez o mesmo com Yorgói.  Dessa vez, no entanto, a escolhida de Corellon Larethian não exitou. Tendo novamente uma ação, clamou pelos poderes purificadores de seu Deus para destruir e dissipar o mal que dava poderes ao artefato que tinha em mãos. Sem ligar para a própria vida, ela viu o poder divino arrancar a força mágica do diário, que caiu como um livreto qualquer no chão.
Radamanthys não tardou a entender o que se passava, sua lâmina uma vez mais cortou a carne da meio-elfa, arrancando mais sangue e deixando-lhe outro ferimento perpétuo. O subalterno das sombras também agiu abrindo a garganta de Yorgói como se fosse um animal no abatedouro. O sangue vermelho pintou o chão, enquanto o pobre gnomo engasgava no próprio sangue. A clériga desesperou-se e buscou defender-se, embora não parecesse ter muitas esperanças.
Mas foi nesse exato momento, que Sirius Black apareceu. - Aí está você, Sirius.. enfim chegou.. - disse Radamanthys recebendo-o com um sorriso.



Um comentário:

  1. Acredito que para melhorarmos nosso poder de atravessar furtivamente devemos não só utilizar Rock como escravo, mas amordaça-lo. Assim podemos passar sem tanta dificuldade por desafios insignificantes.

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