No fundo do amplo aposento, preso sobre um altar, crucificado como alguém que morrera para pagar pelos pecados da humanidade, estava Halaster Mantonegro, o arquimago insano que governava as masmorras Sob a Montanha. Ele parecia inofensivo e mantido vivo apenas como um brinquedo para os caprichos da deusa de todo o mal.
- Veja, Mago Louco. Não foi você quem disse que se você caía, outros viriam para me derrotar? Onde estão eles? Espere.. eram esses míseros lacaios da sorte os heróis intrépidos que salvariam o mundo? Estes que jazem aprisionados na própria arma com que pretendiam esmagar minhas inocentes trevas com sua luz assassina? Pois saiba que a poeira de seus corpos jaz aos meus pés e suas almas vão ser destruídas juntamente com esse fútil consolo do sol. Você perdeu, Mago Louco.. sua senhora, Mystra, perdeu.. minha amada irmã Selune perdeu.. todos perderam... Toril será destruída e eu terei de volta tudo que me foi tomado!!!
Subitamente, no entanto, Halaster abriu os olhos que não escondiam a insanidade que habitava sua mente e que sempre impedira os deuses de lerem seus pensamentos. Sem dizer palavras alguma, ele atirou-se sobre ela como se pudesse tê-lo feito a qualquer momento. Suas mãos velhas e enrugadas tocaram o artefato do sol e libertaram-no das trevas que o cobriam. Sem a dor aguda e desagradável, a Senhora da Escuridão recuperou a plena consciência própria dos deuses, permitindo a ela saber inclusive o que aconteceria a seguir. O arquimago Halaster Mantonegro sumiu imediatamente, antes que qualquer coisa pudesse ser feita, recebendo do cetro de Lathander o poder para usar a magia de Mystra naquele antro de Shar.
Roberta e Torpinson foram os únicos mortais em toda a existência a testemunhar a frustração da primeira dos deuses e sobreviver. Isso não significou escapar à dor.. uma dor que os lapidaria a não falharem no futuro. Todo aquele ódio expandiu a escuridão e reverberou pelo Plano das Sombras.
Perto dali, ainda que além do alcance imediato das trevas de Shar, Halaster Mantonegro surgiu no salão de reunião onde se encontravam seus aprendizes. Todos urgiram preocupados e submissos, mas o Mago Louco os expulsou com palavras ásperas e terríveis. Afastando-os e sem tempo a perder, ele dirigiu-se para uma porta, que depois de aberta deixou correr uma colossal pilha de incontáveis objetos.
- O que busca, mestre? Podemos ajudá-lo?
- Cale-se seu imbecil paquidérmico de abissal grandeza. Você Sabe Quem estará aqui a qualquer momento se puder sentir isso que trago em minhas mãos. Aqui está.. finalmente! - Com essas palavras, Halaster Mantonegro uniu ao Cetro de Lathander um bastão de cancelamento. O item mágico não só cancelou todos os atributos e rastros mágicos do artefato de Lathander como impediria que qualquer meio de busca ou divinação o encontrasse. Não parecia importar ao senhor das masmorras Sob a Montanha que tal ato também prendeu as pobres almas que jaziam no interior do artefato em um limbo perpétuo.
John Falkiner soube que estava morto e aquelas eram as Planícies Cinzentas, afinal de contas não era sua primeira viagem àquele lugar, que a maioria via apenas uma única vez. Dessa vez, no entanto, tudo estava calmo e pacífico. Nada de hordas infernais capturando almas aterrorizadas. Haviam apenas alguns poucos e esparsos grupos de almas que clamavam por suas divindades. Chamou-lhe atenção a maior concentração que eram de elfos clamando por Corellon Larethian, senhor dos elfos.
O clérigo se pôs a chamar por Kelemvor, deus da morte, enquanto via alma após alma ser resgatada pelo brilho de seus deuses, em geral bons ou netros. Apenas os elfos, assim como ele, iam ficando. Muitos dos que partiam eram servos de Chauntea e outras divindades da natureza. Falkiner resolveu então avançar caminhando até a muralhas das almas falsas e condenadas que divisavam o reino dos mortos.
Pelo caminho inóspito, cruzando entre os espíritos suplicantes, ele viu surgir entre os brilhantes símbolos sagrados das divindades, o sol radiante de Lathander. Antes de partir, após recolher seus fiéis servos, o patrono dos nascimentos e do amanhecer chamou-o:
- O que faz aqui esquecido e abandonado, campeão do bem? Tu que fostes puro para empunhar meu cetro caminha sem destino. Onde está seu deus dos mortos para ampará-lo e cobri-lo com as glórias de que és mais do que digno? Venha comigo de coração aberto e recebas as recompensas eternas que mereces.
John Falkiner, ex-servo de Kelemvor, que já tinha aceito o poder de Lathander em vida no momento derradeiro desta, aceitou a oferta e sua alma, enfim, encontrou o descanso eterno.
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