31 de dez. de 2012

Além...

Yorgói pensou novamente em Deborah, o único pensamento que dava forças ao seu espírito para continuar existindo. Não era simples para ele suportar o tormento perpétuo de ser um prisioneiro daquele lorde diabólico. Enquanto as outras almas eram consumidas como cerveja barata ou utilizadas como combustível para os ataques que seriam lançados contra os Sete Céus, ele parecia ter alguma importância para o tal Orcus, senhor máximo de todas as hordas abissais e infernais. O mestre gnomo sabia que isso tinha alguma coisa haver com Rock dos Lobos. Pensou se não teria sido melhor ter permanecido em Águas Profundas lecionando magia para garotos riquinhos e cheios de espinhas ao invés de unir-se a um grupo de aventureiros destemidos. Pensou na confiança que Ehtur Telcontar sempre lhe transmitiu. Na pureza de Daphne da Grande Floresta. No amor sem tamanho de Úrsula e Arnoux Suarzineguer. Na nobreza de Ryolith Fox. Na sede de conhecimento de Rock. Lembrou-se até mesmo da simpatia ambivalente de Sirius Black. Querendo ou não haviam se tornado seus amigos.. talvez estivessem tentando salvar o mundo.. ou os mundos todos.. naquele exato momento. Tinha certeza de que era isso que estariam fazendo e que ele cantaria uma ótima canção sobre isso se estivesse vivo e livre.
Desde que morrera, não tinha mais noção do tempo e já podiam ter se passado muitos anos desde que aquela guerra sangrenta começara. Graças à cópia distorcida do jovem bárbaro que chamavam de Kcor, o vil e desprezível Orcus conseguira não só o controle sobre todo o Abismo, bem como conquistar os Nove Infernos. Yorgói pudera assistir de camarote os lordes diabólicos e demoníacos caírem de joelhos: Demogorgon, Graz'zt, Mephistopheles, Baphomet, Baalzebul e até mesmo Asmodeus.. centenas deles.. seres cuja existência ele sequer cogitara eram agora lacaios de Orcus. Isso fora suficiente para criar o maior exército de que a existência provavelmente tinha notícia. Havia seres ali que nem mesmo os mais completos compêndios da Fortaleza da Vela deviam ter registro. Embora o caos imperasse naquele exército, este avançava como um tsunami pronto a varrer o que quer que houvesse pela frente.
A alma de Yorgói Dossantis seguia presa na gema esmeralda do cetro do senhor de todos os diabos e demônios de onde tinha uma visão privilegiada de tudo. Ele viu os lordes diabólicos e demoníacos se curvarem um a um ante o poder de Orcus e agora atuarem como seus generais submissos. Apenas Asmodeus permanecia aprisionado, empalado pelo próprio cetro aumentado enormemente, numa agonia perpétua que lembrava a todos do que Orcus era capaz. E Yorgói sabia que o malévolo e diabólico ser ambicionava muito mais. Havia ali também um segundo prisioneiro, cuja fama e poder o mestre gnomo conhecia e adimirava. Elminster Aumar, que fora aprisionado por um certo Nergal, mais um dos antigos lordes que agora servia à nova ordem. O escolhido de Mystra jazia inerte acorrentado ao chão como era próprio dos prisioneiros materiais desse plano. Todo o tempo era sugado fogo prateado de seu corpo.. magia em estado bruto... como Yorgói vira sair de Leila Diniz. Essa força primordial alimentava incontáveis larvas que deslizavam sobre o corpo do maior arquimago de Faerun.
Yorgói viu quando Kcor abriu o derradeiro dos portais sugando as almas que formavam um imenso pentagrama ao seu redor. Ele via ali bebês que sequer tinham tido o prazer de gozar a existência e agora eram consumidas antes de gozar a eternidade, deixando para trás pouco mais que o soluço de um choro. A passagem que se abria era colossal como o mar, vasta como as profundezas do oceano sem fim. O bárbaro de sombras expelia energias tenebrosas capazes de espalhar medo mesmo entre aqueles seres de pura maldade.
- Avancem minhas crianças de fogo e enxofre. Devorem a luz e a paz que nos fez refém do sofrimento pela eternidade. Hoje nosso banquete será frango assado, galinha ao molho pardo e pavão a passarinho. Não restará um anjo vivo ou celestial brilhando quando terminarmos. Hoje as Guerras Sangrentas findarão com o doce sabor de nossa vitória e não haverá mundo que não pilhemos, estupremos e governemos!!!
As tropas marchavam pelo amplo portal aberto com a força das almas ceifadas nas Planícies Cinzentas. Seus tambores e gritos entoavam o fim dos Sete Céus. Sozinho, sem que ninguém pudesse ouvi-lo, o bardo cantou uma triste canção que sua mãe lhe ensinara quando do falecimento de seu pai. Não parecia haver razão para esperança. Do outro lado, via-se um resplandecente céu azul sem nuvens onde um sol vistoso brilhava. Um longo paredão de anjos em armaduras prateadas aguardavam prontos a se sacrificarem pelos Sete Céus. Não havia esperança em seus semblantes.. apenas uma resignação convicta. O tempo parecia parado naquelas colinas de ferro.
A verdadeira surpresa se deu quando Kcor, num piscar de olhos, simplesmente desapareceu e com ele, o portal. Algumas poucas centenas de monstros haviam cruzados, enquanto outros passaram a se destruir ante a frustração da investida. Yorgói percebeu que aquilo não estava nos planos de Orcus e no fundo soube que seus amigos tinham alguma coisa haver com isso. Sorriu, pois sempre devia haver esperança...

25 de dez. de 2012

Adendum...


Lorde Byron e Paulo de Tarso se afastaram de Águas Profundas e das trevas que a envolviam. O servo de Morpheus olhou para o ladino, quando já caminhavam a sós e fez sinal para que evitassem a estrada. Ambos podiam ver o tumulto que tomava conta da multidão além dos muros. A maior parte, mesmo dos guardas das barricadas, debandava desesperados com aquele sinal apocalíptico.
Paulo de Tarso, como sempre, disfarçava bem o que se passava em seu íntimo, mas Lorde Byron parecia alguém capaz de ver além das fachadas tradicionais e indicou que o caminho que deveriam tomar era o sul.
- O que há no sul?
- Nós devemos rumar para a Fortaleza da Vela.
- Nossas existências continuam atadas, clérigo, mas isso não significa que eu deva concordar com todas as suas determinações.
- Eu entendo que você esteja consagrado à Senhora da Escuridão, Paulo.. Borracha.. ou como quer que prefira ser chamado. Isso pode lhe parecer uma vitória, mas é apenas um movimento em um grande tabuleiro. Antes que possamos desempenhar nosso verdadeiro papel nisso tudo, precisamos recuperar nossas existências. Por duas vezes eu o salvei.. uma do inferno e outra do purgatório..  mas isso cobrou um quinhão de nossas almas. Apenas o Tomo de Mystra pode nos restituir nossa antiga condição...
- E o tomo está na biblioteca do sul? Não acredito que o poder de Mystra possa ser a solução, clérigo. Nesse tempo todo, aprendi que seus mistérios apenas cuidam de manipular os outros e se estou aqui, é porque tens interesse em me manipular. Se eu encontrar meus camaradas, eles poderão usar as magias das trevas para me salvar.
- Eu não posso culpar a Senhora da Escuridão por nada disso, meu jovem. Enquanto deusa, ela está apenas cumprindo o seu papel primordial. No entanto, você e seus colegas, apenas estão fortalecendo os inimigos de sua própria deusa. Se você quer auxiliar sua rainha das trevas, deve vir comigo para o sul.. recuperar a totalidade de sua existência e só então restituir a ela o que ela sempre mais almejou...
- E quem é você para saber o que ela sempre mais almejou?
- Eu sou alguém que já viu os sonhos dos deuses, rapaz...
- E qual seria o sonho de Shar, servo dos sonhos?
- Ter o que Mystra lhe roubou...
- A maior inimiga de Shar é Selune.. você não me engana, Lor..
- Pelo contrário.. Selune é irmã gêmea de Shar. Não há uma sem a outra, mesmo que possa parecer haver escuridão sem luz... Mystra, por outro lado, é filha de ambas e confiscou a cada uma um quinhão de seus poderes. Com o Tomo de Mystra, você poderá devolver à sua deusa tudo que ela mais deseja...
Paulo de Tarso pensou por um instante, desejando poder ter a certeza que cortar a garganta do servo de Morpheus lhe traria algum alento, mas sabia que havia sabedoria além de mistério naquelas palavras.
- E se isso for apenas mais um de seus joguetes?
- O que você tem a perder?
- Que assim seja, Byron.. mas não espere nada de mim. Tão logo tenhamos o tomo, eu farei o que tenho que fazer...
- É justamente isso que eu espero de você, servo da escuridão. Agora devemos seguir...
- Mas o sul é para lá... - indicou Paulo de Tarso.
- Antes temos de passar pelas ruínas de Soubar. Há alguém lá à nossa espera com os livros que precisamos para adentrar a Fortaleza da Vela...

18 de dez. de 2012

Uma luz sob a montanha...

Daphne deixou a estalagem de Annia atordoada com tudo aquilo e resolveu perambular pelos templos que haviam ao redor do anfiteatro. O movimento diminuíra após a Assembléia Máxima, mas ainda haviam muitos fiéis no interior das basílicas e catedrais. 
A maior e mais destacada dentre as casas dos deuses era o templo de Shar com suas grandes torres de mármore negro, que eram das mais altas da cidade. Ao lado deste ficava o templo de Loviatar, deusa da dor e do sofrimento, onde ela pode ver um pequeno grupo que se mutilava sob os comandos de uma clériga, mas sem gritaria ou baderna, um sofrimento austero, soando apenas os chicotes. A seguir estava o templo de Mask, senhor dos ladrões, que ela conhecia bem e onde viu uma celebração glorificando as ações do imperador e do deus dos espertalhões. 
Na rua ao lado havia um pequeno templo de Shandakul, senhor das viagens e dos caminhos, que era o menos movimentado. O templo seguinte pertencia a Azuth, deus dos magos, onde uma magia coletiva era elaborada para proteger toda a cidade nos combates vindouros. Depois deste estavam as igrejas de Akadi, deusa do ar, e de Gruumbar, deus da terra, ambos divindades elementais, onde pessoas ajoelhadas rezavam para os céus e para o chão, respectivamente, parecendo alheias aos arredores. 
Por fim, completavam a praça os templos de Talos, lorde da destruição, onde uma longa fila de pessoas caminhavam até uma fonte onde quebravam cerâmicas, pratos e estatuetas em adoração ao Senhor do Caos. Adiante, estava a Basílica de Myrkul, menor apenas do que a de Shar. Daphne sabia que aquela era uma antiga divindade da morte e dos mortos, que fora substituída por Cyric e depois por Kelemvor  nos últimos 15 anos. Mesmo assim eram numerosas as pessoas que sentadas e de olhos fechados rezavam no interior amplo. Auril, deusa do frio, possuía aqui um templo tão grande quanto os de Gruumbar e Akadi, deuses de maior grandeza, e parecia contar com muitos fiéis, que portavam velas acesas por um fogo frio e azul. Waukeen, deusa do comércio, contava com modesta igreja, tão diferentes das que a druida já vira, sem ouro ou prata. Imperava a sobriedade e os espaços amplos como em tudo mais.
Haviam muito devotos preocupados com as trevas de Shar sobre Águas Profundas e seus pedidos eram de proteção contra o mal que crescia no oeste em todos os lares divinos. Todos temiam que a Dama das Trevas lhes devorasse as almas e obliterasse toda a existência. Não parecia segredo para ninguém ali, mesmo para o mais embrutecido escravo, as intenções da Senhora da Escuridão. Depois de milênios presos entre as sombras, o neonetheres não pareciam dispostos a mergulhar nas trevas perpétuas.
Daphne passou pelos templos dos deuses da natureza e das divindades neutras dedicando-lhes suas preces e pedindo sabedoria naquele momento tão difícil. Foi quando ela estava praticamente sozinha no templo de Shandakul, entregue às preces, enquanto um grupo de senhoras cuidava do altar, que viu surgir o sombrio homem que avistara durante a Assembléia Máxima. Ela logo viu que se tratava de um dos filhos do imperador Telamont. Ele aproximou-se e fez um cumprimento respeitoso ao altar e outro à druida.
- Saudações, embaixadora da Grande Floresta. Eu vim levá-la de volta para o seu lar...
- Não irei passar mais tempo aqui?
- Todos já foram liberados para retornarem às suas comunidades e comunicá-los da decisão e convocação para nossa guerra. Os que podem fazê-lo já estão seguindo e eu fui responsável por teleportá-la com a graça de Shar. - O príncipe das sombras fez sinal para que ela o acompanhasse. Ele era alto e parecia jovem ainda, tendo passado pouco dos trinta anos, ela diria. Os cabelos e os olhos eram negros, mas a pele um tanto pálida. - Meu nome é Melegaunt Thantul. Posso ver que a graça de Shar não lhe agrada.. pois lhe farei uma pergunta: o que você pensa ser a arte das trevas?
- Me parece um instrumento... uma outra forma de fazer magia.
- Parece que existe mais sabedoria em você do que nos seus. Posso ver no seu belo olhar que não é como os outros. Todos apressadamente dizem ser o contrário da magia. Aquilo que Shar trás aos seus é uma possibilidade de se construir magia.. assim como o faz Mystra e outros mais. Meu povo sobreviveu graças a esse conhecimento e ao bom uso dessa força. Graças a ela, meu pai vem governando com sabedoria há mais de mil anos. Ao contrário de meus irmãos, não anseio pelo dia em que ele perecerá e terá início uma guerra fratricida pelo poder entre eles. Eu acredito que depois dessa prolongada prisão, há muito o que ver e admirar em nosso vasto império.
- Ainda assim, as forças alheias à vida e à natureza que elas carregam me perturbam...
- Eu posso nos levar pelo tecido mágico de Mystra se você preferir, não seria um problema para mim. - Melegaunt tocou a mão da druida enquanto começava a conjurar a magia e os levava para longe dali. O príncipe das sombras, no entanto, deixou sua atenção recair mais sobre a companhia, o que acabou diminuindo a precisão de seus gestos arcanos. Assim, o destino do mago das trevas não saiu como o planejado. Ele e sua acompanhante surgiram em um escura caverna cercados por uma batalha. Ao redor deles estava um grupo de kuo-toas lutando contra o que pareciam aventureiros humanos. 


Ehtur foi o primeiro a reconhecer Daphne, após derrubar um homem-peixe próximo. Sirius, Úrsula, Muadib e Falkiner investiram contra as criaturas libertando os escravos. Estavam à margem do rio subterrâneo sob a montanha, por onde os kuo-toas traziam seus escravos. Enquanto os skums tentavam fugir, todos ali descobriram que havia mais naquelas águas turvas. Surpresa maior que a chegada da druida e de seu acompanhante causou o ataque de Sirius Black contra Francisco Xavier, que fez o mago se desfazer em um brilho fulgás. Antes que pudessem tomar providências vendo que o ladino de Selune estava dominado, foi a vez de verem Ehtur Telcontar sucumbir ao domínio mental. Ele investiu contra Muadib, enquanto Sirius atacou Daphne.
Sem saber do que se dava na batalha, Ryolith e Rock garantiam a segurança dos outros libertos e de Rose Anne em um aposento anterior. Leila Diniz pressentiu o que acontecera com seu protetor e resolveu avançar.
Mais adiante, John Falkiner, Muadib e Úrsula investiam contra as águas na esperança de deter o monstro marinho de comandava a dominação de seus colegas. Daphne percebeu que se tratava de um aboleth e atirou-se às águas tomando a forma de um octopos gigante. Seus tentáculos agarraram-se ao monstro, que não exitou em dominá-la, no entanto. 

Mesmo assim, a investida da druida garantiu o necessário para que o clérigo de Kelemvor clamasse pelo poder divino da morte e fulminasse com cólera celeste o corpo da criatura. Ainda que esta tenha resistido, o aboleth se viu gravemente ferido. Melegaunt Thantul aproveitou para libertar os dois humanos de seu controle.

Sob a chuva de ataques do sobrevivente da masmorra e da matadora de magos, a criatura optou por fugir. Resgataram Daphne e puderam então se reagrupar para conversar. Daphne contou sobre o que se dera na Cidade Obscura, enquanto eles embarcavam as pessoas em botes que haviam por ali. Lembraram aos marinheiros que eram livres e que ninguém poderia mudar isso.
- Como chegaram aqui? Ninguém pode se teleportar para essa masmorra Sob a Montanha. - questionou Falkiner.
- Nenhum lugar é vedado para mim, homem de Suzail. Inclusive, eu vim apenas trazer a embaixadora e se é com vocês que ela deseja ficar, eu partirei, mesmo achando que ela mereça melhores companhias. De qualquer forma, devem saber que Nova Netheril irá sempre proteger o seu povo. Meu pai é um homem justo e sábio. Adeus, Daphne. - Melegaunt conjurou o teleporte e nada aconteceu. Todos riram, com exceção de Daphne. - Deve haver alguma proteção mágica. Mas usarei meus poderes das sombras e isso não me impedirá.
- Espe.. - tentou alertá-lo Leila Diniz, mas Melegaunt descobriu por si próprio que aquilo também não funcionou. O mago não disfarçou sua insatisfação.
- Eu preciso descansar. Depois de estudar minhas magias poderei sair daqui.
- Claro, claro.. - iam dizendo os demais, que já tentavam alcançar Ehtur e Sirius que não haviam ficado perdendo tempo com a conversa. Ryoliyh Fox aproveitou para confirmar com sua fé que Melegaunt não era mau como os outros nethereses e sombrios que o paladino conhecera. Os dois já haviam chegado à caverna mais adiante, novo caminho que alcançaram seguindo a fé de Falkiner.
- Daphne Amkathra? Minha filha? - Todos puderam escutar os gritos de uma mãe desesperada. - Olhe só pra você!!! Parece um espantalho! Que roupas são essas? Você parece uma perdida, menina. O que eu fiz pra merecer isso, minha filha? Seu pai se matando para ganhar o controle da cidade e o respeito que nossa família merece e você indo regar árvores? Isso só pode ser carma, meu Máscara.. ó senhor dos ladrões, por que? 
- Mãe.. agora não é hora para isso... e você sabe muito bem o que eu penso da sua família...
- Você sempre será uma de nós.. uma Amkathra.
- Minha família está na Grande Floresta! - E com aquelas palavras, ela se transformou num elfo negro para enxergar melhor na escuridão e auxiliar seus amigos.
A fé de Falkiner os levou até uma estreita caverna com um chão repleto de runas mágicas. Não eram simples runas marcadas magicamente, mas sim runas místicas primordiais, uma das formas mais antigas de se fazer magia. Elas cobriam todo o chão a se perder de vista. Uma rápida inspeção revelou que causariam grande estrago. Leila Diniz e o clérigo combinaram seus poderes para anular as primeiras, mas suas forças se esgotaram antes de um terço delas. Melegaunt disse que só poderia fazer algo caso descansasse e diante de tal impasse, optaram por descansar todos. Úrsula e Muadib acharam uma sala anexa guardada por uma armadilha, enquanto os demais buscavam o repouso. Após transpô-la, eles encontraram algum dinheiro e itens mágicos.  Falkiner, por sua vez, usou o poder de Kelemvor para se transformar em um ser etéreo vagando em segurança além do alcance das magias das runas. Ele chegou até uma caverna ampla e dali para uma sala imensa repleta de ácido fumegante e esmeralda. Retornou antes que o poder findasse e alertou os colegas. 
Durante o turno de Daphne, ela avistou um vulto espreitando no corredor. Ehtur e Muadib já haviam visto rastros de homens lagartos ou similares que passavam sobre as runas. O guardião de Mielikki sentia o cheiro rançoso do ácido no ar, que parecia mais forte nessas horas que se passaram.
Antes de tentar uma nova partida, atendendo às súplicas do bárbaro Rocck, Melegaunt liberou um feitiço que foi capaz de temporariamente anular as runas. Vinte e uma sucumbiram ante seu poder das trevas. Ele despediu-se uma vez mais de Daphne e conjurou seus poderes para uma viagem planar. Todos duvidaram, mas dessa vez ele se foi. 
Avançaram e conseguiram anular as três últimas runas. Isso deixou o caminho livre para que seguissem até o ponto em que acessaram a caverna perpendicular, mais larga. Naquele ponto, encontraram uma barricada e acabaram alvejados por um relâmpago mágico. Preferiram, entretanto, usar de diplomacia e convocar o dragão para um acordo.  O lacaio dracônico trouxe o imenso dragão que era seu mestre:
- Eu sou Keygrodekkerrhylon, senhor desse rio e dessas cavernas. Vocês ousam invadir minha morada, ameaçar meus servos e cobiçar meu tesouro?

- Perdoe-nos grande dragão, mas não é essa nossa intenção.. - intercedeu Muadib.
- Temos uma importante missão.. - acrescentou Daphne.
- Fomos enviados pelo dragão Inferno para resgatar um artefato.. o cetro de Lathander. - completou Falkiner.
- O cetro do sol me pertence. Tudo aqui me pertence.
- Ele é necessário para expulsar as trevas que cobrem Águas Profundas - disse Daphne.
- E você não parece ter tanto governo por aqui.. - provocou Falkiner.
- Os kuo-toa perturbam meu território com sua deusa vadia e seus escravos, mas ainda sou o senhor dessas cavernas. O que se passa lá em cima não me importa, humanos. Os tempos são prósperos para mim. Este artefato é de minha propriedade e não irei entregá-los a vocês. 
- Nós podemos pagar por ele eliminando os kuo-toa - retrucou Ehtur. 
- Isso não me interessa. Vocês precisariam de muito ouro..
- Quanto?
- Um milhão de peças.
- É demais para nós.
- Eu aceitaria outro artefato igualmente poderoso - ponderou o imenso dragão.
- Nós possuímos um artefato.. - disse Leila Diniz olhando para o amuleto de Ryolith Fox.
- Ou melhor.. dois.. - completou Rock olhando os óculos de Sirius.
- Escolham quem deixará seu artefato ou eu decidirei! - Disse Ehtur sem pensar duas vezes. O paladino segurou entre os dedos o símbolo sagrado de seu deus que pertencera a um dos maiores paladinos da justiça daquele mundo. Sentia um enorme carinho por aquele objeto que sempre o fez sentir Tyr mais próximo dele Enquanto isso, a tensão permanecia.
- Por que eu tenho que entregar o meu artefato? Eu acabei de recebê-lo.. por que sempre eu tenho que me sacrificar para salvar a todos por aqui? Sempre o Sirius.. sempre eu que...
- Cale-se, seu ladrão egoísta. Se alguém deve se sacrificar aqui, esse alguém sou eu! - Ryolith Fox arrancou o amuleto e atirou ao dragão.. - Com ou sem amuleto Tyr, a justiça e a verdade sempre estarão comigo e com os justos. Aqui está, dragão... onde está o cetro do deus do sol?
Com satisfação, ainda que segurar o amuleto lhe causasse enorme dor, Keygrodekkerrhylon os conduziu até uma caverna contígua onde lhes entregou o cetro todo de ouro com pedras preciosas cravejadas. Assim que deixou as mãos malignas e escamosas do dragão, o artefato passou a brilhar como uma estrela dourada. O dragão negro lhes orientou que poderiam tomar as águas de sua caverna para chegar até o mar e dali até Águas Profundas. Tão logo o fizeram, John Falkiner, que recebeu o artefato viu que podia respirar mesmo sob as águas. Nadaram tudo que puderam até avistar a superfície, onde encheram uma vez mais os pulmões com ar.
Estavam muitos quilômetros em alto mar. Haviam apenas alguns botes ao longe entre eles e a torre de trevas que crescera na Cidade dos Esplendores. 


13 de dez. de 2012

Sob o mesmo céu


Quando Daphne despertou, viu que a vasta sombra da Cidade Obscura ainda pairava sobre a Grande Floresta. O emissário Hadrhune já esperava por ela e partiram assim que ela disse estar pronta. Ele teleportou os dois com a força mágica tenebrosa de Shar, o que não deixou de incomodar a serva da natureza. Desde sua possessão, Daphne percebia que aquelas forças mágicas ofertadas pela Senhora da Escuridão eram mais do que uma antítese do poder de Mystra, afinal existia escuridão sem luz, mas não luz sem escuridão.
A urbe onde apareceram era como nenhuma outra que Daphne tivesse visto. Certamente era uma cidade de grande porte, de cerca de vinte e cinco mil habitantes, com construções sóbrias e pesadas. A parte central era mais elevada, além de possuir construções maiores e mais escuras. Ali onde apareceram, os prédios eram menores, muito próximos uns dos outros. Tinham cores cinzentas e frias, sempre tendendo aos tons mais sombrios e foscos.
Não havia nada ali que parecesse capaz de animar os espíritos dos viventes a não ser a bela vista do mundo lá embaixo. Daphne via que a cidade estava se movendo e logo também estava ela a acompanhar o emissário do senhor deste lugar. Por mais que andasse e observasse, não havia colorido, não haviam plantas e eram poucos os animais. Mesmo assim, a druida não perdeu tempo em estabelecer um vínculo espiritual, já preparado na noite anterior, com os corvos que iam atendendo ao seu chamado.. quatro ao todo. Além deles, ela vinculou-se a um rato, com o intuito de que esses olhos fossem úteis naquele ambiente perigoso e desconhecido.
Por mais que se aproximasse do centro da cidade, não havia decoração, adornos ou belas fachadas. Haviam apenas linhas retas e objetividade. As pessoas andavam nas ruas em perfeita ordenação, em filas que não se atrapalhavam mesmo nos cruzamentos das ruas. Não havia gritaria ou barulhos, jogos nem confusão. Alguns indivíduos voavam, caminhavam pelas paredes ou fundiam-se com as sombras dando mostras da energia mágica que cercava a cidade das Sombras. Senhores indiferentes eram carregados ou conduzidos por escravos. Com estes estavam a maior parte dos animais, que ela entendeu serem familiares ou servos convocados, muitos com traços abissais ou sombrios.
Chegaram finalmente a um imenso anfiteatro, Era um amplo prédio semi-circular onde caberiam facilmente milhares de pessoas. Daphne entendeu que ali era o local da Assembléia Máxima, já ouvindo as muitas vozes que perturbavam o mórbido silêncio da cidade. A arena ficava no centro de uma praça cercada de templos. Ela reconheceu alguns como o de Shar, Gruumbar, Auril e Shandakul, mas viu que haviam muitos mais. Nenhum no entanto de boas divindades como Selune, Lathander, Tyr ou Mystra.
O interior do anfiteatro era intimidador, todo em mármore negro, com colunas retorcidas, relevos macabros e gárgulas sinistras. No palco ao centro, estavam muitos homens tenebrosos e ainda mais sinistros. O mais terrível talvez fosse o que estava sentado ao centro a observar tudo. Ele trazia uma coroa negra na cabeça e um olhar de arrogante domínio sobre tudo que via. De cada lado dele estavam sentados seis outros homens também imponentes, mas ofuscados pela grandeza de um astro maior. Os mais próximos do centro pareciam mais velhos do que os das pontas. Haviam muitos outros indivíduos ali ainda a ouvir, servir ou simplesmente paparicar aquelas treze figuras sentadas. Todos pareciam mesclar-se com as sombras como Hadhrune.
Este indicou a Daphne que tomasse assento. Ele indicou a platéia onde uma gama diversa de sujeitos aguardava conversando em pequenos grupos. A druida considerou que tratava-se de gente de diferentes regiões do que esses sombrios servos das trevas chamavam de Nova Netheril. Hadhrune então seguiu em direção ao palco e ao imperador, enquanto a serva da natureza aproximou-se do público com cautela, sentando e observando.
Um homem próximo puxou conversa e confirmou as expectativas dela, pois vinha de uma das cidades próximas da Grande Floresta, da região devastada pela erupção das Montanhas das Estrelas. Enquanto conversava, ela viu se aproximarem um par de elfas. As únicas do belo povo por ali. Ela reconheceu uma delas de imediato, pois tratava-se de Annia Evalandriel, que envolvera-se com Sirius. A elfa estava muito produzida e elegante, cheia de jóias e penduricalhos, muito diferente de quando era uma ama da rainha dos elfos.
- Olá, querida.. Daphne, não é mesmo?
- Sim...
- Sou Annia.. de Evereska.. creio que se lembre de mim..
- Sim, sim, Annia. Lembro bem de você quando estivemos lá há mais de um ano...
- Como o tempo voa, não é mesmo? Fico feliz de vê-la aqui nesse conselho.
- Estou representando os druidas da Grande Floresta.. fui trazida por um dos sombrios e..
- Bom saber que reconhecem o poder de nosso vasto império. Como vai Sirius?
- Na verdade, ele está preso sob as trevas de Shar que tomaram Águas Profundas.
- Que notícia terrível... - disse Annia sem conseguir disfarçar a preocupação genuína. - Mas sei que os poderes dele são grandes.. ele há de ficar bem. Esse é mais um motivo para nos concentrarmos na esperança que nos traz nosso imperador. O regente Rhange Hesysthance Sorrowleaf me enviou como embaixadora para representar Evereska. Nossa cidade vem prosperando sob o comando do regente, que no entanto não descansa enquanto não libertar a alma da rainha Querdalla. Nossos soldados buscam até o último dos phaerimms. Aliás, nessa empreitada, ele conseguiu recuperar a alma de um dos gnomos do seu grupo...
- Arnoux? Será possível?
- Sim, sim.. o regente apenas não libertou sua alma, pois sem o corpo, isso representaria a morte do gnomo. E o arquimago Sorrowleaf tem grande apreço pelo casal de gnomos... se quiser, irei me reportar a ele após a assembléia, pode me acompanhar e tratar da alma de seu aliado...
- Seria ótimo e...
- Silêncio todos. - ecoou pelo ambiente a voz de Hadrhune. Como um senescal, após golpear o chão três vezes com seu cajado, ele anunciou que falaria o Príncipe das Sombras Telamont Tanthul, imperador de Nova Netheril.

- Meu povo de Nova Netheril, meus caros arautos e representantes de cada cidadão de nosso vasto império, sejam bem vindos à nossa capital. - Ao se levantar, o imperador Telamont pareceu crescer, como se todas as trevas ali não fossem mais do que partes periféricas de seu corpo. por um intante, Daphne pensou que cada sombra ali era uma parte dele. - Agradeço a todos por responderem tão prontamente a esta convocação, pois o tempo urge contra nós. Não recuperamos nossa glória para vê-la...
- Não há legitimidade possível nessa reunião.. - bradou outra voz. Logo, estavam ali dois seres tão ou mais sinistros do que aquele que ocupavam o centro daquele teatro. Ambos eram mortos-vivos, com corpos decrépitos e apodrecidos. Um era gordo e pelancudo, dobrando em massas de carne sobrepostas. O outro era esquálido, parecendo feito apenas de pele e ossos. Daphne via neles as mesmas forças necromânticas nefastas com que Szaas Tam a profanara.


Ao despertar, todo o grupo com a comitiva de libertos não demorou a descobrir que já eram procurados pelos kuo-toas. Tomaram o cuidado de manter as pessoas libertadas, os dois kuo-toas cativos e Rose Anne Amkathra afastados do combate, posicionando-se para dar conta dos homens-peixe. Sirius Black derrubou os primeiros antes que pudessem se dar conta do que estava acontecendo. Muadib usou de sua mobilidade e agilidade para atingir os inimigos com seus múltiplos ataques e recuar. Ehtur garantia a segurança com o alcance de sua lança, protegido em um corredor contíguo. Úrsula mantinha-se a salvo disparando suas flechas e John Falkiner voava acima de todos liberando magia divina. Na retaguarda, Ryolith Fox, Rock dos Lobos, Leila Diniz e Francisco Xavier garantiam a retaguarda.
Dessa vez, no entanto, os servos de Blibdoolpoolp, a Mãe do Mar, não contavam apenas com suas lanças terminadas em afiadas pinças. Para surpresa de todos, um relâmpago largo rebentou no corredor eletrocutando os que não conseguiram evadir. A maior parte dos antigos escravos dos homens-peixes tombou quase mortos. Os heróis suportaram o ataque, mas viram que era hora de investir contra os guerreiros que ainda restavam antes do clérigo da Mãe do Mar. Enquanto isso, aqueles que estavam na retaguarda aproveitaram para curar os caídos. Os dois Kuo-toas, mesmo com braços amarrados, aproveitaram a distração para fugir pelo corredor que Ehtur deixara livre. Rock tentou detê-los com uma muralha de fogo, mas eles foram mais rápidos. Leila Diniz precisou concentrar-se para anular o novo relâmpago conjurado pelo clérigo kuo-toa. Isso deu tempo para que os demais chegassem até ele e o vitimassem.
Neste ponto, finalmente a fé de John Falkiner mostrou-lhe que a direção do destino mudara. Seguiram com o receio de estarem se afastando do real destino. Uma terrível armadilha na porta seguinte derramou sobre Úrsula e Muadib que tentavam abri-la uma chuva ácida venenosa. Isso mitigou a força dos músculos de ambos, fazendo Úrsula desmaiar. O servo de Kelemvor precisou clamar pela benção do deus dos mortos para realizar a necessária cura. Em seguida, abriu um túnel na parede para evitarem a porta.

Mais à frente, depois de acompanharem os rastros dos kuo-toas, encontraram a entrada principal do templo dos homens-peixe. Na direção oposta, já sabiam que estavam muito próximos do rio subterrâneo de onde vinham os escravos. A fé de Falkiner indicava que o caminho principal estava ao centro dos dois rumos. No entanto, a empolgação descuidada do clérigo acabou revelando a presença deles para os seguranças do templo.
Rock conseguiu colocar uma magia de silêncio atrás deles, evitando atrair a multidão do templo. Todos atacaram e conseguiram rapidamente matar os inimigos. O caminho estava livre...

- Eu sou Aumvor, aquele que não pode ser morto, guardião da magia de Netheril, aquele que sobreviveu à tolice de Karsus.
- Não é possível falar no glorioso reino de Netheril, se os dois únicos arcanos de Netheril que restam neste mundo não são ouvidos.  Eu sou Larloch, Senhor das Mil Criptas, mais antigo arquimago do maior império que já existiu. Este enclave não pode clamar por uma glória sem resgatar seu passado, príncipe Telamont.
- Nova Netheril não nega, mas sim busca resgatar as glórias de outrora, nobres arquimagos. Certamente, nosso império está pronto a prestar contas e reconhecer-lhes os devidos títulos e recompensas, caros senhores. Sentem-se aqui ao meu lado.. essa glória não seria glória alguma sem o respaldo de vossas argutas mentes - disse Telamont fazendo sinal para que os filhos mais próximos dessem lugar para os dois recém-chegados.

Os dois lichs parecem ter se dado por satisfeitos, tomando seus lugares ao lado do imperador. Suas órbitas vazias pontuadas pelo sinistro brilho vermelho fitaram a multidão como se fossem seus escravos. As trevas por ali tão plenas não pareciam incomodá-los, mas muitos foram os presentes na platéia que sentiam o medo vindo dos dois.
- Continuemos então, agora com a presença de todos que aqui merecem estar, meus estimados cidadãos. As forças destrutivas de Shar cobrem a chamada Cidade dos Esplendores. Aquelas trevas primordiais logo se expandirão e alcançarão as boas terras de nosso vasto império. Farão isso se não nos mobilizarmos para proteger nossos filhos.
- Quem você quer enganar? - gritou um homem em meio à platéia, que pelos burburinhos, Daphne descobriu ser o embaixador de Secomber, uma importante cidade ao sul da Grande Floresta. - Todos sabemos que vocês servem a Shar...
- Olhe ao seu redor, simplório homem! - Ordenou o imperador com raiva, mas sem perder a diplomacia. - Existe sim um templo de Shar nessa cidade e muitos servos dessa deusa primeira, mas há também um templo de Gond, senhor da construção.. um templo de Gruumbar, senhor da Terra.. um templo de Azuth, senhor dos magos e muitas outras divindades. Há servos de Shar em Nova Netheril, mas nunca escravos de seus desígnios. Nosso objetivo é o bem estar de nosso povo! Para tanto é necessário mobilizar um exército. Cada cidade e cada região deve convocar seus cidadãos para defender nossa pátria, nosso solo e nossos filhos. Cada um de vocês, embaixadores aqui presentes, deve retornar ao seu lar e inflamar o coração de seus irmão para que possamos salvar Águas Profundas e todo esse mundo. - As palavras fortes e hábeis do imperador Telamont iam conquistando todos ali e até mesmo Daphne via nelas uma preocupação genuína de um governante para com seus governados. - Escutem o meu chamado, meus filhos. Quem entre vocês está comigo? Quem entre vocês ama esse império? Quem entre vocês concorda com marchemos para salvar Águas Profundas?
Todos ergueram as mãos, muitos com entusiasmo. Daphne logo percebeu que apenas meia-dúzia de embaixadores não o fizeram. Cinco deles preferiram se abster e apenas um deles, o embaixador de Secomber, se negou a concordar. Rapidamente um mar de trevas o envolveu e ele despareceu para terror de todos. Nas duas questões que se seguiram, ninguém mais ousou discordar. Decidiu-se que todas as cidades cederiam membros de sua população para formar um exército que marcharia para o oeste para salvar a Cidade dos Esplendores das trevas de Shar. Com a vitória, seria a vez de cuidar dos problemas com os zhentarianos no leste e os insurgentes de Suzail ao sul.
Desse modo, os embaixadores foram dispensados, enquanto a cúpula central entregou-se a conversas internas. Daphne deixou o anfiteatro e foi convidada por Annia a acompanhá-la até a estalagem que pouco distava dali. Lá chegando, ela usou de um pergaminho de divinação para criar uma tela onde podiam ver o arquimago Sorrowleaf. Este pareceu satisfeito ao ver a druida e confirmou-lhe que estava com a alma de Arnoux. Rhange ficou feliz com as notícias anunciadas por Annia e despediu-se com o convite para receber Daphne e seus aliados tão logo a crise fosse debelada.
Antes de partir, a druida recuso o convite da elfa, que já fazia pequenas carícias em seus cabelos ruivos. Não muito longe dali, através dos olhos de seus corvos, ela sabia que os embaixadores que haviam se abstido na votação não tiveram a mesma sorte dos demais, sendo capturados na saída e conduzidos ao que parecia ser o prédio da guarda.



7 de dez. de 2012

Ainda Sob a Montanha.. a sombra cresce...



Daphne despertou na Grande Floresta. Sentiu a paz que apenas seu lar lhe proporcionava. Viu que estava com Gaios e Costeau. Eles discutiam, mas ficaram felizes ao vê-la despertar. A Grande Floresta também sorria dentro dela.
- O que houve? Onde estão...
- Você foi corrompida pela escuridão. As trevas de Shar que a habitaram tomaram Águas Profundas - respondeu Costeau abruptamente.
- Mas como?
- Acalme-se, Daphne. Você precisa descansar e se recuperar. Ehtur nos alertou de que as trevas de Shar haviam se apossado de você. Eu o enviei em companhia de Costeau para resgatá-la, mas ao que tudo indica, a Senhora da Escuridão conseguiu concretizar seus planos devastadores. - Enquanto falava, o velho druida de longas barbas brancas guiou-a em direção ao perímetro das árvores. De lá, a abnegada druida viu a imensa montanha de escuridão que se erguia no oeste. Ela entendeu logo o que era aquilo. Algo em seu íntimo sabia que era um câncer que devoraria toda a vida.
- Meus amigos estão lá? Tenho que...
- Você tem que esquecer daqueles baderneiros urbanos. Aqueles malditos punks vem trazendo confusão atrás de confusão para nossa floresta. Não precisamos deles.. 
- O momento é de regeneração, Daphne. - interviu Gaios. - Ainda estamos abatidos pelo avanço dos tenebrosos nethereses. Suas forças avançam cada vez mais e..
- Eu entendo, mas tenho de ir até eles.. alertá-los e então retornarei.
- Você precisa se recuperar. A floresta ainda não a abençoou o suficiente para extirpar as sequelas do mal que a invadiu. Não há como dimensionar as consequência de ter a deusa da escuridão em ti. Certo é que isso foi ainda mais terrível que as diabruras de Szass Tam.
Daphne concordou em repousar. Ela havia sentido a deusa da escuridão dentro dela. O ser mais antigo da existência.. a força primeira que havia dado origem a tudo. Embora isso lhe trouxesse calafrios, Daphne entendia melhor agora o que movia Shar. Não era simplesmente maldade ou uma força irracional que buscava a destruição. Era uma consciência de um tudo que via na obliteração do todo, o único caminho para alcançar a graça inicial, a paz de ser tudo que apenas ela tinha conhecido. Toda aquela vida da Grande Floresta lembrou aquela druida, serva de todos os aspectos da natureza, que destruição e nascimento faziam parte do mesmo ciclo. O que poderiam fazer se era a hora daquele tempo morrer? Viria um novo tempo?

Os pensamentos e a conversa foram interrompidos pela sombra que cobriu as árvores denunciando a cidade voadora de Nova Netheril. Em um instante, estava entre eles um sujeito sombrio, envolto em trajes de um mago. Empunhava um cajado bifurcado na ponta e parecia um com as sombras.
- Saudações druidas da Grande Floresta. Meu nome é Hadrhune, um emissário do príncipe das sombras e imperator de Nova Netherill Telamont. Venho como um embaixador trazer-lhes nossa diplomacia.
- Que diplomacia é essa que vem depois de destruição e devastação? - questionou Gaios tomando a dianteira da discussão.
- O mal de Shar se espalha sobre Águas Profundas e logo alcançará tudo mais.. não há tempo para amenidades como essas, velho druida. A Grande Floresta é parte de Nova Netheril e eu venho buscar um de vocês para que representem os seus na Assembléia Máxima.
- E se não concordarmos com isso?
- Vocês podem protestar e queixar-se no espaço que lhes compete ou eu posso procurar outros druidas que estejam mais dispostos a cooperar. Nosso império estende a mão a vocês com uma esperança no momento em que tudo mais parece desmoronar. A Grande Floresta terá seu assento, assim como todas as partes de nosso vasto império. Nós faremos essa velha floresta prosperar e crescer como nos antigos tempos de Netheril. Suas árvores tornarão a cobrir as areias do Grande Deserto.
- O seu império tenebroso e nefasto mata os guardiões dessa floresta.. nos aterroriza com dragões.. nega a magia fecunda de Mystra.. usam da magia negra da mesma deusa que diz combater.. trás morte e desequilíbrio.. Ainda quer nos convencer de que são nossos salvadores? Vocês são conquistadores sanguinário, servo das sombras. - disse Gaios investindo contra o embaixador. Este não mudou de expressão e com um simples gesto, lançou um pequenino raio negro de seu indicador. O raio atingiu o mais velho daqueles druidas em cheio e logo mais ele não estava lá. Apenas um monte de cinzas restou. Daphne percebeu que aquela era uma magia da tessitura das sombras de Shar e viu seu maior mentor ser destruído por ela.
- Eu posso destruir cada um de vocês sem a menor dificuldade, mas não é isso que eu vim fazer. No entanto, não terei problemas em fazê-lo. A Grande Floresta é território de Nova Natheril e pela lei é crime se opor a um emissário direto do rei. Tenho o direito de executá-los sumariamente.. mas o que eu ganharia com isso? Apenas o trabalho de procurar outros druidas.. escolham um de vocês.. essa pessoa deve me acompanhar...
- Nós iremos cooperar.. entendemos o recado, embaixador. - disse Costeau. Rapidamente chegaram a conclusão de que Daphne seria quem iria acompanhá-lo. Ela temia pelo próprio círculo sem Gaios, mas não pode escapar à questão. Conseguiu ao menos o direito de terminar suas orações e seu descanso. Hadrhune viria buscá-la no dia seguinte. Costeau partiu para alertar seus camaradas, deixando-a em companhia dos demais druidas do círculo que responderam ao chamado da morte de Gaios. Daphne dormiu pensando em corvos.




Eliminado o kuo-toa, foi a vez de liberar o acesso para os camaradas e libertar os cativos. Eram três homens e uma mulher, todos eles humanos. Ryolith Fox sentiu a maldade em três deles. Um era mais velho e estava bastante acima do peso. Após acordá-los, descobriram que eram três membros da família Thuul e um segurança. Haviam sido capturados enquanto fugiam da cidade desesperados com a escuridão e seu navio foi atacado por algo que os lançou ao mar. O patriarca Zabbas era arrogante e violento. A filha dele, Shallyn, preocupava-se com pai, embora parecesse confiar em Sirius e seu brilho lunar. 
Como a fé de John Falkiner lhes dizia que o caminho era seguir em frente, buscaram ali e Sirius Black acabou encontrando uma passagem secreta. Esta, no entanto, dificilmente poderia ser aberta por esse lado. Mesmo com a força de todos ali reunida, nada se deu. Por fim, foi o servo de Lathander que clamou pelos poderes do deus da morte e tornou-se etéreo como um fantasma. Ele atravessou a parede espessa e encontrou um vasto aposento sem iluminação. Via apenas o brilho perdido de uma luz refletida no horizonte, que perfilava uma multidão de centenas de criaturas. Sem ter o que fazer, o clérigo retornou.
Não tendo outra opção e acompanhados do quarteto, além de Rose Anne Amkathra, o grupo avançou pelos corredores sob a montanha, tendo de silenciar o patriarca gordo dos Thuul que insistia em querer comprá-los com um dinheiro que não tinha e a tratar a filha com desprezo. Sirius seguiu buscando por armadilhas com a ajuda de Úrsula. Moadib e Ehtur vinham logo atrás rastreando e prontos para qualquer eventualidade.
Mais à frente, encontraram o grupo de kuo-toas, que eliminaram sem maiores dificuldades, inclusive fazendo dois prisioneiros além de libertar mais escravos. Conseguiram melhores informações sobre os inimigos, entendendo que trabalhavam próximo a um rio subterrâneo que dava acesso ao mar por onde traziam os escravos. Haviam muitos deles. Moadib disse que evitou a região por perceber que eram numerosos. Isso criou o complicador de aumentar muito a comitiva e dificultar que avançassem em segurança. Encontraram armadilhas e tesouros, mas acabaram optando por descansar antes de continuarem.