25 de set. de 2015

Só o amor destrói...


Entre a dúvida se aquilo era apenas mais uma ilusão e a visão dos elfos ao longe, o grupo travou uma longa discussão. Não parecia haver como retornar. Derdeil Óphodda tentou desfazer a ilusão, mas sua magia de desfazer magias apenas afetou a área como faria normalmente, mesmo que empunhasse o amuleto em forme de Z. Kaliandra Boaventura sentia o desejo de ir contra os elfos e encontrar Shei Long para dar cabo de seu nêmesis, mesmo que fosse uma ilusão. Mari'bel dedicava-se aos rastros, que tão logo se afastou o suficiente da base da montanha, percebeu serem de dezenas de elfos de pés pequenos que surgiam ali e seguiam para o norte. Eles existiam acima de rastros de animais de cerca de cinquenta dias atrás. Edgar voou à frente para ver a multidão de elfos em marcha, enquanto Ohterrível, que não parava de crescer, voou para o alto da montanha.
Pegando o amuleto de volta, Rufus Lightfoot resolveu ele mesmo ativá-lo. Através de sua concentração, ele percebeu que seus sentidos estavam ampliados, mas seus colegas viram que isso veio com a mudança dos olhos e orelhas do hobbit, que pareciam monstruosos agora. Ao invés de assustá-lo, isso o incentivou a continuar. Uma nova tentativa fez o pequenino se sentir mais ágil do que nunca, mas o fez ter pernas peludas de carneiro como um fauno.
Tudo isso, no entanto, ficou em segundo plano quando Ohterrível retornou com um gargântico dragão vermelho. Apesar do temor inicial, a criatura conversou com eles e estava decidido a ajudá-los. O dragão Arishvashtrinclis disse que podiam chamá-lo de Ari e ofereceu-se para levá-los em suas costas, enquanto ia explicando a perfeição que era aquele mundo comandado pelos dragões.
- A Primeira Floresta é o território sob o domínio de Invaerhnum... - Ele ia dizendo e lá do alto eles podiam avistar a massa verde que se estendia para o norte, o oeste e o leste até o limite de suas vistas. Mari'bel mal continha a felicidade em ver seu lar pleno e imaculado, enquanto o dragão ia explicando como o domínio do dragões nunca havia sido desfeito nesse mundo.
Ao passarem pelos elfos, estes curvaram-se e reverenciaram o gargântico dragão vermelho. Nesse momento, com sua pequena luneta, Rufus reconheceu uma elfa verde entre os inúmeros elfos de pele dourada. Era a amiga de Kaliandra, Trina Blair. O hobbit que que escamoteara suas mudanças usando um chapéu de disfarce alertou os demais, pois seguia separado voando sobre Ohterrível, que já era grande como um cavalo.
Uma mensagem mágica chegou a ela, mas a arqueira elfa verde não aceitou as palavras, pois afirmou que Kaliandra estava morta há cinquenta anos. Isso levou a um debate por mensagens mágicas, mas Ari prosseguia voando para a Primeira Floresta, enquanto os guardiões elfos montados em grifos abriam caminho.
Três dragões verdes chegaram para recebê-los. Quando pousaram, Mari'bel aproveitou para comungar com aquelas árvores que eram como suas mães, suas irmãs e suas filhas. Foi nesse momento, quando as energias mais puras e primordiais se conectaram, que a ilusão tornou-se insustentável.

Todos viram-se uma vez mais na fonte. Rufus Lightfoot nada tinha de suas transformações. Mari'bel sentia a dor do vazio de perder a Grande Floresta, mesmo uma Grande Floresta ideal que nunca existira. A killoren buscou novamente por rastros, mas nada havia. Estavam ali, como sempre, apenas as portas coloridas. Não havia sinal nem mesmo do caminho pelo qual eles haviam chegado até ali.
- É inútil escolher qualquer caminho. Será apenas outra ilusão! Isso aqui já é outra ilusão! - Protestou Derdeil Óphodda.
- O que fazer, mestre? - Gralhou Edgar. - Só temos ilusões...
- Não só... Existem coisas que foram reais... Você não é mais um kobold, não é mesmo?
- A mulher githyank cara de sapo também sumiu...
- E o que você sugere, Derdeil? - Questionou Kaliandra.
- Eu preciso de poder. De poder e do amuleto... Só assim poderemos vencer o poder que nos prende nessa espiral labiríntica maldita!
- Você quer que entreguemos nossa força vital? - Desconfiou Mari'bel.
- É nossa única esperança. Se não sacrificarmos nossas vidas ilusórias nunca despertaremos para a realidade, Mari'bel. Chega de andarmos em círculos! Eu tenho o poder do fogomágico e irei queimar minha própria essência para nos tirar daqui...
O olhar do escolhido do deus da magia fitou os olhos de Kaliandra Boaventura com a mesma determinação arrogante do dia em que se conheceram em Invernunca. Algo no peito dela dizia que ele sabia do que estava falando. Algo nela acreditava nele.
- Está bem... Se esse é o preço da minha vingança...
Mesmo com menos convicção, mas cansados de tantas voltas, reviravoltas e retornos, Rufus, Ohterrível e Mari'bel também concordaram. Dentro da fonte, Derdeil Óphodda absorveu aquela energia que lhe era entregue, empunhou o amuleto de Zalathorm e derramou todo o fogmágico que seu corpo podia comandar. Por um instante foi como se a própria realidade não desse conta de tanta energia. 
Depois, ele viu-se em um lugar quente e enevoado.

- Parece que eu subestimei sua capacidade, Óphodda. Mas não cometerei esse erro de novo... - soou a voz de Zalathorm.
Derdeil não teve sequer a chance de responder, pois já estava mais que paralisado, uma vez que seu corpo era incapaz de seguir o fluxo temporal. Sua mente e seu corpo estavam entregues agora a um estado de ausência eterna.
- Mestre Zalathorm, queira entender... - tentou falar Edgar que chegara no ombro do escolhido do deus da magia.
- Não dessa vez, ave traiçoeira! - Decretou o nethyarca supremo de Halruaa fazendo o mesmo com o corvo. - É incrível que mesmo com suas tramoias e seu apetite servil pela destruição, tenha ainda a fidelidade dos seus, mago.
Um a um, Zalathorm usou seus poderes para libertar a energia vital dos demais das tramas pessoais de Derdeil Óphodda. Primeiro veio Rufus Lightfoot, que pode ver o velho mago nu em meio à névoa. Depois foi a vez de Mari'bel. Enquanto eles se recuperavam e tentavam entender, chegou Ohterrível. Por último e mais difícil de separar foi Kaliandra Boaventura.
- Mesmo condenados a partir com esse mundo após perderem minha primeira oferta, vocês conseguiram retornar para a possibilidade de um amanhã. Ainda assim, vocês quase serviram de combustível para a ganância e a cobiça desse servo do excomungado maldito.
- Nós ainda queremos salvar Faerun... - Interviu Mari'bel. - Em nome do equilíbrio. Temos de impedir os planos da aranhuda maldita!
- Não há mais uma Faerun a salvar! - Anunciou o nethyarca sem parecer realmente triste com aquilo. - A senhora das aranhas completou sua missão
- Não é possível! Eu ainda preciso de minha vingança... - Lamentou Kaliandra. - A aranhuda não pode ter vencido!
- O que tinha de ser já o foi. Ela realizou o sacrifício desse mundo que julgava alçá-la além dele para prender o próprio fluxo da existência em sua teia. No entanto, ela acabou consumida na pira de seu próprio incêndio, assim como tudo mais além de nós. Somos tudo o que restou. Faerun vive apenas em nossas memórias. Agora devem entender que são seres do universo e não de um mundo.
- Uhu... pirata dos planos... - Rufus ajeitou o tapa-olho. - Vamos Azuzu III.
- E Derdeil? - Questionou Kaliandra olhando para o homem paralisado e alheio a tudo ali.
- Ele terá o mesmo destino que seu mestre e seus planos... A ruína! - Disse Zalathorm esticando um indicador para completar a invocação anaquiladora.
- Eu não acredito que Rhange esteja destruído... - Foram essas as palavras da trovadora da espada que mudaram tudo.

Zalathorm não teve tempo para expressar sua surpresa ou frustração. Rhange Hesystance, o deus da magia estava ali antes que o som da última letra escapasse aos lábios da elfa. Não havia mais névoa ou calor. Zalathorm já não estava mais lá. Nem sequer um grão de seu ser restou.
O sinistro deus sorriu como um maníaco para Kaliandra, ao mesmo tempo que Derdeil Óphodda e Edgar recuperavam sua pertença ao fluxo temporal daquele pequeno bolsão dimensional que pertencera ao nethyarca de Halruaa, mas que tinha um novo senhor agora:
- Parabéns, Derdeil. Você saiu melhor que a encomenda... Até mesmo o amor que você plantou nessa mulher nos serviu bem. E agora temos todo um mundo para moldar sem que haja quem possa nos deter!
Edgar voou e posou sobre o ombro de Rhange crescendo como um corvo salvagem.

Em um instante, a casa de banhos não existia. As árvores que Mari'bel via lembravam-na da Grande Floresta. De seus pensamentos vieram também cogumelos, flores, insetos, anfibos e pássaros. Ourtos seres iam se apresentando, surgindo entre as árvores. Um treant, um centauro, elfos.
- Mas e quanto aos demais deuses, mestre? - Dizia Derdeil ainda aturdido com tudo aquilo.
- Não existem deuses, Derdeil. Nunca existiram! Nunca vão existir! Só existe um deus, Rhange Hesysthance!!!
- E Óphodda é seu profeta... - Completou Edgar.
- Mas e Selune? - Disse Derdeil exitante.
O golpe do cajado de Rhange em sua cara o calou e o lançou ao chão, enquanto uma lua despontou no céu como o sorriso de um gato. O deus da magia gastou menos que o tempo de um olhar com o astro celeste.
- Não tenha medo de dominar, Derdeil! Você tornou tudo isso possível! Até mesmo quando agiu despropositadamente como amando aquela tola, você estava plantando as sementes de nossa vitória! Agora é a hora de nossa colheita, meu filho! Levante-se e governe!
- Bibiana.. - Murmurou Kaliandra vendo os elfos que chegavam, mas nada aconteceu.
Por sua vez, Derdeil Óphodda avançou até o centauro e o degolou com um só golpe de sua adaga embebida em fogomágico. Quando o corpo da criatura tombou, duas novas emergiram, um humano e e um cavalo.

18 de set. de 2015

Tudo que é sólido desmancha no ar


Derdeil Óphodda percebia fragmentos de outros planos na junção da porta multicolorida. Ela surgira em pleno ar à frente deles depois que voltaram mais uma vez de uma ilusão para a fonte onde as alucinações começavam. Mari'bel olhou pelo chão e viu os rastros de um humano andando de cócoras para esta porta. As pegadas vinham do ponto da parede onde haviam encontrado a porta marrom do peixe invisível.
Rufus Lightfoot tentou tocar a porta multicolorida em busca de armadilhas ou pistas, mas o hobbit-aranha e pirata espacial acabou paralisado.
- Foi uma das cores apenas... A verde creio... - Entendeu Kaliandra Boaventura analisando as forças cromáticas primordiais a todo o espectro mágico. - Isso não é simplesmente um tipo de magia. É algo inerente a qualquer tipo de magia.
A guardiã killoren se debruçou sobre aquelas pegadas e sabia que se tratava de alguém poderoso, ancestral e que não era nenhum daqueles cujos rastros ela acompanhara até aqui. Percebeu que havia algo de ritualizado naquele estranho modo de se mover.
- Não temos tempo para mais disso. Edgar imite esses passos! - Ordenou Derdeil ao seu familiar corvo em forma de kobold.
- Assim ó... - explicou Mari'bel mostrando como.
O pequeno Edgar fez como ordenado e ao encostar na porta, desapareceu junto com ela. Rufus voltou a se mover.
- Nem sinal deles.. - Mari'bel atravessou o lugar.
- Não sinto mais Edgar... - ponderou Derdeil.
- Outro plano é o que parece... - falou Kaliandra.
- É esse o peixe? - disse Rufus Lightfoot ao pegar o peixe invisível e cair de bunda na água da fonte, o que fez a água espirrar no dragão Ohterrível.
Isso também fez com que se abrisse a porta marrom de onde saíam os rastros. Mas atrás da porta estava mais uma vez o inevitável de formas geométricas e tom mecânico:
- Vocês perturbam o fluxo dos planos e devem ser julgados por isso.
Rufus se adiantou às ações do extraplanar, conseguiu se mover e espiar do outro lado vendo o aposento repleto de rodas dentadas, placas metálicas e outras engrenagens. Depois disso, foi como se o próprio tempo parasse.

Edgar viu-se em um lugar quente e úmido. Havia muito vapor no ar e o chão era liso. Ele caminhou e conseguiu evitar cair em uma grande piscina que havia ali. Enquanto margeava a borda, ele ouviu uma voz:
- Seja bem vinda, pequena criatura. Você e seus companheiros realmente se superaram para chegar até aqui...
- Zalathorm? - O familiar questionou incrédulo vendo o velho enrolado em uma toalha branca.
- Vocês poderão sobreviver ao que parece a esse mundo.. - prosseguiu falando o velho.
- Queira perdoar a incompreensão vossa magnanimidade, mas é que estou preso nessa forma vil e monstruosa. Não fosse isso, fosse eu um belo corvo como antes e entenderia sua sabedoria.
- Não seja por isso... - disse o nethyarca supremo de Halruaa. Em um instante, Edgar era de novo um pequeno corvo negro. A emoção foi tamanha, que ele não tinha palavras por alguns segundos.
Quando o fluxo temporal retornou, todos viram-se presos até o pescoço por casulos metálicos, não conseguiam ver os próprios corpos e nem mover um músculo sequer. Com apenas as cabeças livres viam o imenso inevitável que se assemelhava a uma esfinge. Flutuando próximo estava o inevitável que os capturara.
- Estes que aqui são apresentados, Derdeil Óphodda, escolhido de Rhange Hesysthance, do reino de Halruaa em Faerun, Abeir-Toril no ano das Tempestades Relampejantes, Mari'bel da Grande Floresta, serva de Timothy Hunter, Rufus Lightfoot, também conhecido como o pirata espacial Hobbit Aranha, Kaliandra Boaventura, espírito materializado da capitã de Myth Drannor no reinado de Amídala Ancalímon no ano da Ascensão dos Elfos, Óhterrível, representação da jovialidade bondosa dracônica e agora dragão de bronze errante, doravante denominados de acusados, são responsáveis por ininterruptas viagens planares, desequilibrando a harmonia móvel dos planos da existência muito além de suas prerrogativas como naturais de regiões definidas da realidade. Sendo assim, os acusados infringiram muitas regras que incorrem em penas gravíssimas.
- Isso é uma ilusão... Mais uma ilusão... - Gritou Kaliandra. - Isso não é real, não é real, não é real...
- Eu não aceito tais acusações! - Protestou Mari'bel. - Em tudo que faço sou uma agente do equilíbrio. Toda a minha existência tem se pautado pela luta e pelos ensinamento do equilíbrio. Quando minhas mãos energizadas buscam acalmar um ferido ou quando meus dedos ágeis disparam contra os agentes da senhora das aranhas, eu sou uma agente do equilíbrio. Ouvindo a sabedoria do Primeiro Pai, sentindo o amor da Primeira Mãe, brilhando a força vital das fadas e da natureza, eu tenho sido uma agente do equilíbrio. Desde o equilíbrio da menor e mais simples semente até o equilíbrio dos mais longínquos e incompreensíveis planos! Eu sou uma agente do equilíbrio!!!
- Você não cumpriu o seu papel! - Os olhos da esfinge metálica brilharam com um azul intenso e Mari'bel foi totalmente obliterada restando apenas uma marca de queimado no ponto onde ela estivera presa.
- Isso é uma ilusão... Mais uma ilusão... - Gritou Kaliandra Boaventura. - Isso não é real, não é real, não é real. Eu vou ter minha vingança!
- Sua vingança dar-se-á assim que esse mundo complete o ocaso já iniciado.
- Eu preciso terminar minha missão... Tenho que me vingar de Shei Long para me tornar uma valquíria.
- Assim, nesse ponto descruzado tal fato já é considerado feito.
Os olhos da esfinge brilharam num tom vermelho dessa vez. A trovadora da espada viu-se livre e sentiu um par de asas irromper em suas costas. Ela sentia todo o poder invadi-la, sua força crescer, sua vontade tornar-se incontornável.
Derdeil Ophodda não se abalou com a morte de uma ou com o sucesso da outra. Ele apenas fechou os olhos e se concentrou. O escolhido do deus da magia buscou se focar no fogomágico que o habitava, vencer o que quer que fosse aquilo.
Mais uma vez, Derdeil abriu os olhos. Ele e os demais estavam em pé na fonte.
Dessa vez, no entanto, não havia porta com energia cromática. Também não havia rastros de alguém que caminhasse de cócoras.
Sem saber o que poderiam fazer, todos tornaram a tentar agarrar os peixes. Mas a atenção de Derdeil Óphodda foi desviado pela voz de Edgar falando seu nome em sua mente.
- Edgar está vivo - ele disse, enquanto Rufus erguia o peixe azul da água.
A porta de mesma cor se abriu e revelou o eladrin do outro lado.

- Queira perdoar minha emoção, ó poderoso mago - Edgar disse agitando as asas e voando para perto do velho.
- Isso não é nada, pequenino. Como lhe disse, aqui é o espaço das possibilidades para os que não irão sucumbir com esse mundo - disse Zalathorm sem alterar o tom de voz.
- Viemos como nos convocou, ó poderoso mago, mas eu sirvo o grande Derdeil Óphodda, que é quem merece todos os créditos por chegarmos até aqui.
- Então, pequeno ser que porta em si a energia do deus da magia depositada em ti por esse Derdeil Óphodda. O que há nesse homem que faz com que ele mereça ser salvo?

- Escutei outra voz. A voz de Zalathorm... - Derdeil disse mais uma vez errando um dos peixes que tentava agarrar. - Edgar está com Zalathorm.
Foram as últimas palavras dele antes de desaparecer.
- Que lugar é esse? - Disse Derdeil perdido entre a névoa. - Edgar?!?
- Estou aqui, mestre.. - respondeu o familiar pousado no ombro do velho mago envolto numa toalha.
- Graças a seu familiar e à sua perseverança, filho de Halruaa, você aqui chegou podendo sobreviver ao fim desse mundo que se aproxima. No entanto, isso passa por você escolher uma trilha que o desvincule dessa sina que não seja sua.
- Eu vim cumprir minha missão, nethyarca supremo. Temos de salvar Halruaa ou o que resta dela. Temos de levar esse poder a quem pode resolver tudo...
- Não diga esse nome ou você sacrificará todas as opções que restam para que escapemos a essa entropia que carrega tudo deste plano para o derradeiro final. Por que você o serve mesmo sendo ele um agente cabal da destruição de seu próprio mundo?
- Eu caminhei na escuridão quando servi a pálida sombra que era Azuth, que se achava digno de ser deus dos magos. Mas logo atingi o bom senso! Diga meu nome! Eu sou Derdeil Óphodda! Eu vim aqui como um cidadão dessa magocracia porque fui convocado por você, mas minha vontade só serve a um só: Rhange Hesysthance Sorrowleaf, o verdadeiro e único deus da magia e dos magos!
Ao termino dessas palavras, o deus da magia se materializou ali diante deles, decretando que seria o fim de Zalathorm e que Derdeil o servira bem como sempre cumprindo sua missão.
- Parece que sua mente está presa demais a esse mundo para sobreviver a ele... - falou Zalathorm e Derdeil percebeu que o que vira fora apenas mais uma ilusão. - Adeus, Derdeil Óphodda!
Dito isso, o escolhido do deus da magia foi destruído e Edgar voltou a ser um simples corvo. Mas não por muito tempo, com um toque do nethyarca no pássaro, Edgar sentiu mais poder do que nunca.
- Eu vejo que existe uma outra energia vital remanescente em você, pequeno corvo. Não seria esta quem merece prosseguir pelos múltiplos planos da existência?
- Sim, ó grande Zalathorm. Ela é realmente um ser único... Kaliandra Boaventura
A trovadora da espada viu-se num lugar enevoado bastante distinto da fonte. Não deixou de se surpreender ao deparar-se com o velho envolto numa toalha. Logo reconheceu Edgar no ombro dele.
- Esta é Kaliandra, mestre.
- Seja bem-vinda, futura valquíria. Espero que ao contrário de seu camarada esteja disposta a se desapegar dessa existência que se desfaz... - falou o velho mago.
- Eu sou movida pela vingança contra o maldito Shei Long. É isso que devo fazer para tornar-me uma valquíria. Nada mais me importa.
- É verdade isso? Nem mesmo a deusa dos elfos? Ou o destino desse belo povo? - Provocou Zhalatorm.
- É por eles que me vingo... - Ponderou Kaliandra.
- Sendo assim, sucumbirá com eles e esse mundo - determinou o mago.
- Desapega, Kaliandra - gralhou Edgar.
- Onde está... - ela ia pensando no companheiro, mas mudou as palavras. - Minha raposa Fox?
- Eu posso lhe oferecer sua vingança. Posso entregá-la a você antes do fim, mas desde que esteja certa de abandonar suas raízes nesse mundo perdido e seguir para as potencialidades maiores da existência múltipla - continuou Zalathorm.
A elfa ponderou entre a razão e seus sentimentos. Por mais que aquilo parecesse estranho, ela sabia o que fazer.
- Está bem. Eu aceito... Mas existem os outros... Mari'bel...
Dito isso, a guardiã killoren surgiu naquele ambiente úmido e esfumaçado. Ela também chegou sem entender muito, mas ao ver Kaliandra soube que aquele devia ser o tal Zalathorm.
- Seja bem vinda, pequena fada. Espero que como anunciado por sua aliada, você também esteja disposta a deixar para trás o cadáver dessa existência para buscar os brotos germinantes do universo - sorriu o velho mago.
- Eu não quero que esse mundo morra... Não aceito que perdemos para a aranhuda maldita! - Protestou Mari'bel.
- Se quiser carregar as energias vitais que a habitam para novos amanhãs é preciso que reconheça que o equilíbrio passa por deixar que o que deve perecer pereça.
A resposta do mago foi a concordância silenciosa de Mari'bel, que já sentia o luto em seu peito.
- Também tem o Rufus... - completou Kaliandra. - E minha raposa Fox.
O pequeno hobbit, ao contrário da raposa familiar apareceu ali.
- Isso é uma sauna? Por que você tá de toalha se tava aqui sozinho? Pronto, acabou? Podemos ir embora?
- Você precisa deixar pra trás isso tudo que acaba e... - foi dizendo o mago.
- Posso levar meu dragão? - Interrompeu Rufus. - Ele nem é daqui mesmo...
- Isso não será problema... - sorriu Zalathorm parecendo animado com aquele grupo. - Agora que todos que estão verdadeiramente prontos, devemos seguir. Seremos um grupo lançado nas correntes incertas da multiplicidade incontrolável dos planos. Os únicos que saberão que um dia houve um lugar como esse que deixamos. Assim como cheguei a este mundo trinta e sete mil anos atrás, deixo-o agora na companhia de vocês e...
- Derdeil. Derdeil Óphodda... Falta ele, mestre... - gralhou Edgar interrompendo.
Isso fez com que Derdeil Óphodda se materializasse mais uma vez.
- Rhange Hesysthance!!! - O escolhido do deus da magia surgiu dizendo.
- Nãããooo... - gritaram os demais, mas já era tarde demais.
Todos abriram os olhos. Estavam em pé na fonte.
Não haviam peixes dessa vez.
Logo viram que não haviam rastros, nem mesmo os deles.
Haviam apenas as seis portas de cores diferentes.
- Vamos ver as portas... - Disse Rufus Lightfoot para Ohterrível já caminhando para a porta roxa. Atrás dele veio Mari'bel rastreando informações nos menores detalhes.
Derdeil e Kaliandra trocaram acusações, mas isso parecia inútil agora.
A porta roxa não tinha nada e não parecia ter sido nunca mexida. O hobbit a abriu e encontrou uma escada que subia. A killoren encontrou alguns grãos de poeira de deserto.
A porta vermelha também nunca havia sido mexida, atrás dela, no entanto, havia uma escada que descia. Nela havia pequeninos cristais de enxofre.
A porta laranja não tinha sinais de ser mexida e também revelou uma escada que subia. Mas ali, Mari'bel não encontrou sinal de nada, considerando aquilo perfeito demais como numa ilusão.
Rufus averiguou o mesmo na porta amarela, assim como encontrou outra escada que subia. Mari'bel encontrou algumas pétalas no degrau.
A porta verde revelou outra escada que subia. No degrau havia pólen e folhas.
A porta azul também tinha sua escada que subia, mas nos degraus haviam sinais de gotas chuviscadas.
Eles discutiram por algum tempo qual seria o melhor caminho a seguir e até se haveria realmente um caminho a seguir que não redundasse em mais uma ilusão, despertando novamente na fonte. Cansada de tudo aquilo, Maribel retornou à fonte, fechou os olhos e pegou o peixe invisível. A porta marrom se abriu mais uma vez e revelou um corredor dessa vez.
- Esse é o caminho... - disse a guardiã de Timothy Hunter.
Sem mais demora, eles seguiram pelo corredor. Nele haviam rastros que de um elfo que seguiam até a porta central. Ao final dele encontraram três portas com símbolos em dracônico, um em cada: bem, mal, neutralidade. Analisaram as portas e não encontraram nada além das runas. Ao abrirem a porta da runa do bem puderam ver uma extensa planície de clima temperado.
- Estamos ao sul da Grande Floresta... - percebeu a serva da natureza.
Ainda assim, Rufus abriu a segunda porta, a da neutralidade, que revelou um frio intenso e uma montanha de neve.
- O Pico do Mundo... - disse Mari'bel que sabia ser fisicamente impossível os dois lugares estarem contíguos.
- E a última porta? - Questionou Derdeil, mas os demais não lhe deram ouvidos. Rufus e Ohterrível atravessaram a porta do símbolo do bem e viram que a passagem era como um pequeno túnel no pé de uma grande montanha. Os demais seguiram os dois.
A fada iniciada do arco encontrou por ali muitos rastros de hobbits, uma centena deles, de poucos dias antes. Mas o que realmente chamou a atenção deles foi a comitiva de elfos que passava no horizonte a norte dali.

5 de set. de 2015

Bêbados planos



O solar enfurecido lançou-se contra Derdeil Óphodda, que estava também à mercê do demônio de duas cabeças. O celestial cedeu ao descontrole e isso acabou fazendo-o errar seu ataque vorpal. Ele acabou cortando a fonte e as portas dispararam a bater. Rufus Lightfoot aproveitou o momento e resgatou Mari'bel usando suas mãos mágicas, arrastando-a pro que restou da fonte.


A mente da fada foi tomada pela visão transcendente de um magnífico anfiteatro. Ainda que seu tamanho fosse impressionante, havia algo de magnânimo naquele lugar. Ela identificou logo as divindades que palavreavam ao centro. Ele viu logo o ancestral sequoia que era Silvanus, bem como a mulher fornida e sorridente que era Chauntea, mesmo com a preocupação.

- O mundo está morrendo... eu...- ela dizia com lágrimas nos olhos.
Mari'bel reconheceu ainda Shar, senhora da escuridão, Talos, senhor da destruição, por serem deuses da natureza, e Bane, com quem lutara em Myth Dranor. Haviam ainda mais três, familiares, mas que ela não identificou de imediato.
Acoçado pelo Solar, Derdeil Ophoda escapou para outro plano. Ao ver-se numa ermidão nebulosa, entendeu que estava nas bordas das Planícies Cinzentas. No entanto, o solar logo usou seus poderes e foi atás do escolhido do deus da magia. O celestial surgiu e o agarrou, enforca-o, mas Derdeil conseguiu murmurar um nome:
- Rhange...
Ao fim do último fonema, o solar foi obliterado da existência.

Enquanto isso, Mari'bel se concentrava e tentava ver os deuses. Rufus e Kaliandra Boaventura pensavam em como protegê-la. Derdeil Ophoda usou seu fogomágico para trafegar entre os planos e conseguiu retornar ao aposento das portas. Lá, reunidos na fonte, eles se viram mirando outro lugar. Mari'bel percebeu que não era mais uma visão, eles estavam no anfiteatro.

- Seja bem vinda, minha filha - soou a voz do Grande Pai em sua mente. - Vejo que trás em você a força da primeira floresta, que sua alma é multiplicadora do equilíbrio. Meus olhos sorriem de vê-la assim, mas devo avisá-la que não há em quem confiar-se aqui. Nós devemos lutar pelo equilíbrio... pelo equilíbrio maior.
Mari'bel tentava dar conta daquilo e Kaliandra identificou o senhor do conhecimento, Oghma, bem como o senhor da guerra, Tempus, além dos deuses que a fada lhe falara. Havia outro ainda, um estranho deus escondido num velho manto cinzento, Morpheus. Todos pareciam se ocupar dele, mais que dos apelos de Chauntea.
Porém, a deusa da agricultura tombou exaurida nos galhos de Silvanus. Mari'bel e todos os seres viventes de Faerun sentiram um vazio em seus íntimos, que para guardiã killoren foi algo ainda mais forte. Mais foi a elfa aterrorizada que suspirou um nome:
-Rhange...
 Derdeil Ophoda tinha sua mente ocupada em outro lugar. Ele enxergava a multiplicidade da existência e o movimento cósmico dos planos como se fosse as escamas de uma serpente infindável num perpétuo movimento. Nada era, tudo estava. Ele sentia seu mundo perder-se, agonizar, mas ele já era um cidadão do cosmos. Curiosamente, uma força sedutora e sombria o convidava a deixar tudo aquilo e encontrar a plenitude. Kaliandra e Rufus sentiam o vazio que trás o luto e uma certa desorientação da falta.
Foi então de Rhange Hesysthance, o deus da magia se fez presente. Com seu sorriso sarcástico, ele fitou os outros deuses.
- Você não tem juízo de vir aqui - sorriu Bane golpeando com sua manopla a tribuna de onde falava.
- Nunca tive isso e veja onde cheguei, não é mesmo? - Debochou Rhange. - Posso fazer tudo de novo...
- Não comigo chefiando os trabalhos... - e com essa palavras Bane transformou o deus da magia num tasloi acorrentado.
Mas antes que algo mais pudesse ser feito, a atenção de todos foi capturada pela chegada de Lolth, com seu corpo monstruoso metade aranha, metade drow. Montado nela vinha um estranho demônio, que outrora fora um belo solar, Malkizid.
- Acabou! - Ela disse simplesmente. Isso criou teias finíssimas que prenderam a maioria. Mas a pequena Mari'bel conseguiu se manter livre, assim como Rufus. A fada serva de Timothy invocou o poder natural que houve, havia e haverá em sua vida e atacou a deusa Lolth. As flechas, no entanto, não só erraram, como retornaram para cravejarem o corpo de Mari'bel, ostentando-a no ar como que crucificada,
- Você não é nada! Se nem todos os deuses puderam me impedir, você acha que uma fadinha insignificante poderia? - Gritou Lolth entre a fúria e o triunfo.
- Lolth esse não era o acordo - gritou Rhange Hesysthance que seguia preso.
- Acordos foram feitos para serem quebrados - os olhos da senhora das aranhas queimaram uma chama púrpura.
- Eu sabia - gritou Kaliandra mesmo presa na teia. - Eu sempre soube! O que foi que eu disse? Vingança!!!
Os galhos colossais de Silvanus romperam a prisão de teias e agarraram o corpo de Chauntea. O deus das florestas despediu-se de Mari'bel, lembrando-a em sua mente de que eram agentes do equilíbrio, cada um tinha o seu papel e não podiam confiar em ninguém ali. Isso foi a última coisa antes de Lolth acabar com tudo.

Derdeil Ophoda despertou em um mundo estranhamente familiar. Ele chamou:
- Rhange...
- Eu estou aqui, meu profeta, meu filho.
- Onde estamos?
- Estamos no meu mundo, que assim sendo também é seu...
- É uma honra, mestre.
- Você saiu melhor que a encomenda, Derdeil. Graças a seus esforços conseguimos enfim fazer desse mundo nosso.
- E os outros deuses, meu senhor?
- Que outros deuses? Aqui Rhange Hesysthance é o caminho, a verdade e a vida... - ele deu um sorriso sinistro que assustou Edgar.

Mari'bel acordou em uma floresta Seu coração mal podia acreditar. Aquele cheiro do solo, o gosto das folhas, a temperatura do ar, a luminosidade sombreada, aquela era a Grande Floresta. Seu lar. Ela tateou as árvores mais próximas, mastigou uma amora silvestre que crescia num raio de sol. Procurou rastros, mas o que encontrou foi a desacordada Kaliandra Boaventura. A fada a socorreu, despertando-a.
- Rhange Hesysthance maldito! - Kaliandra gritou com a sede de vingança assim que despertou.
O deus da magia logo apareceu e falou:
- Vocês estão aqui. Mas isso não é ótimo? - Ele disse dominando-a e imobilizando-as. - Adiantaram ainda mais meus planos. Agora o mundo é meu. Agora todos os mundo serão meus. Nada mais pode me impedir pois abriram caminho dos planos pra mim... - foi a última coisa que elas souberam antes de se perderem de todo.

Todos acordam com a cara afundada na areia da praia. Sentiam-se perdidos, enquanto a água do mar vinha e lambia seus corpos. Rufus, Maribel e Kaliandra foram despertando aos poucos. O hobbit se levantou e viu um ser barrigudo pairando acima deles. Tinham dificuldade de lembrarem-se das coisas, mas Kaliandra queria se vingar, sentia a sede por vingança conformando seu ser, embora não soubesse de quem. Rufus se afastou em direção à floresta do outro lado da praia.
O ser barrigudo, que também era barbudo desceu e convocou um kraken. Depois ele fez surgir um banquete se fim. que Rufus comeu como se não houvesse amanhã. Kaliandra Boaventura seguiu gritando por vingança. Mari'bel não aceitou, pois embora não entendesse bem porquê, sentia que não devia confiar em ninguém estranho. Mesmo que seu entendimento dissesse que ele também era uma espécie de deus da natureza, seus instintos diziam para não confiar.
- De quem devo me vingar? - Gritou Kaliandra, que tentava pensar em deuses que a pudessem libertar daquela agonia. A única imagem em seu imaginário foi do gordo e barbudo recém-chegado. Ela o agarrou e perguntou para ele. - Diga-me, ó deus único que eu conheço, de quem devo me vingar?

Kaliandra Boaventura acordou deitada no chão de uma floresta. Sentia uma desorientação, além de dor de cabeça. Em sua mente uma palavra se repetia: vingança. Mas os dedos dela encontraram outra mão. Seus olhos logo viram um belo elfo de meia idade.
- Cameron? - Ela não sabia se a pergunta era para o elfo desmaiado ou para ela mesma. Após despertá-lo, ela viu que haviam muitos outros. Mari'bel, Rufus Lightfoot, Derdeil Óphodda, Edgar, Jorge de Capadócia, Braad, Chuck Norris, Sérgio Reis, Pena Branca. Todos iam despertando, mas também estavam confusos, perdidos. Não se lembravam de como haviam chegado ali.
Atormentada, Kaliandra sacou sua espado e a colocou na garganta de Cameron Noites:
- Quem é você? - Ela dizia sem controlar as lágrimas. Mas ele se desvencilhou do ataque e a beijou com paixão.
Kaliandra cortou a garganta dele e gritou:
- Bibianaaa!!!

Derdeil'Ophoda despertou sozinho boiando nas água de um fétido pântano.
Ele pensou sobre Edgar e o encontrou boiando ali ao seu lado.
Depois pensou na fada Mari'bel e foi a vez dela chegar trazida pelas águas turva. Lembrou-se de Rufus e viu o hobbit ao virar em outra direção. Pensou em Kaliandra e a avistou mais à frente. Foi então que ele sentiu que haviam tipos outros de magia ativos naquela realidade. Foi daí que ele viu que o cruzamento do tecido mágico e de tudo que o cercava era simétrico. Uma combinação perfeita demais. Tudo ali era um figmento de sua imaginação, até mesmo seus aliados. Ele forçou sua mente para despertar, buscando um poder maior que o habitasse.

Derdeil ÓPhoda viu-se na fonte. Estava inteira. Seus colegas estavam ali ao seu lado um tanto desnorteados como ele.
- É tudo uma ilusão! - Disse o escolhido do deus da magia
- Eu estou falando isso desde o começo.. - disse Rufus bufando.
Mari'bel orou para deuses da natureza.
Kaliandra Boaventura orou para Bibiana.
Derdeil Ophoda silencia todos:
- Isso é uma ilusão e temos que sair daqui. Como estamos sendo controlados? - Ele forçou todo seu conhecimento arcano. Derdeil conjurou um quebrar encantamento com o que lhe restava de fogo mágico e isso os fez ver uma porta multicolorida que flutuava no espaço. Kaliandra Boaventura percebia como aquele brilho prismático, na verdade, era a representação da conjunção de todas as energias possíveis nas existências, antes de cruzarem para o outro lado.

Todos despertaram... na fonte.