Em forte Asherben, depois que o grupo se teleportou, Kaliandra viu-se no aposento de Ryolith Fox no templo de Tyr. Cameron Noites a olhava com certa piedade amorosa.
- Você nunca devia ter se prendido àquele pássaro agourento de discurso histriônico... ele sempre me pareceu uma companhia apropriada para o bardo pouco dotado.
- Eu irei cuidar de posicionar e orientar todos os homens e mulheres em condição de lutar que ainda temos - falou Péricles, o chefe da guarda fazendo uma reverência ao santo paladino de Tyr.
- Agora que eles partiram, tenho coisas a tratar com meu deus e esse povo que depende de mim. Temos poucas horas até a horda morta-viva voltar... - Ryolith despediu-se sem parecer importa-se com a elfa ainda um tanto aturdida com a atitude infamiliar de seu familiar.
Cameron os levou de volta às ruas de Forte Asherben, onde tudo parecia o presságio do apocalipse. Carrinhos apinhados de corpos iam sendo carregados para a cremação. Feridos e mutilados eram amparados, enquanto tropas desmoralizadas vagavam sem vontade para os muros.
Encontraram o templo de Bibiana ainda largado como antes. Havia uma grande marola de cheiro forte, não como a erva dos hobbits, mas como cogumelos das profundezas.
Dhyon levantou-se cambaleante ao vê-los entrar e ofereceu o cigarro de cogumelos.
- Com a graça de Bibiana. Sejam bem vindos de volta, meus irmãos de Encontro Eterno. Depois do que aconteceu com a elfa demoníaca Sarya Dlardrageth é melhor deixar pra lá essa ideia de contactar Bibiana.
- Vamos só fumar ae... disse o outro dos elfos Xoge.
Não diga tal coisa - respondeu Kaliandra rispidamente a Dhyon. - Nos momentos de maior necessidade não temos que perguntar o que nossa deusa pode fazer por nós, mas sim o que nós podemos fazer por nossa deusa! Conclamo a todos em oração à Bibiana. Nossa fé inabalável dará a ela as forças para combater o mal.
No altar, ela tocou o chão com o joelho direito e levantou o punho aos céus. - Óh Bibiana, aquela que nos uniu a todos, flagelo das aranhas na escuridão, esperança do belo povo, faço a ti uma reverência, tenha em mim um pilar de sua força e graça, pela união dos elfos, venceremos!
Kaliandra repitiu a oração como um mantra por longos minutos. - Peço a ti, óh deusa de todos os elfos, que me ajude a escolher um famíliar digno de tua glória e poder. Se é da escolha do anterior alçar outros vôos, que assim seja. Tendo repudiado a vida inteira tidas as forças de escravidão, liberto Edgar do fardo de ser meu seguidor e companheiro. Com essas palavras, e pesar no coração, desfaço o elo familiar que nos unia.
No, entanto, Kaliandra sentiu que nada mudou.
- Você precisa tomar sua energia vital de volta... a que depositou no pássaro agourento - disse Cameron. - Só assim poderá ter outro familiar...
- E cuidado... - disse Dhyon um pouco acanhado depois do tom que usara com ele, mesmo que todos tivessem orado em uníssono com você. - Se você acabar vendo o que a outra viu, pode-se ficar catatônica como ela.
- Pô, mas essa oração aí foi muito massa aí... - disse o elfo Rinkho.
- A união não resolveu nada... somos diferentes... estamos unidos.. mas vamos morrer... - disse o elfo Powl.
- Senhores, o temor não pode se apoderar de vossos corações. O que ocorreu foi uma tragédia ainda não esclarecida. Mas nossa confiança não pode se abalar afirmou Kaliandra. Ela pensou e sabia que poderia depositar sua energia vital em outro familiar, mas sem recuperar a energia que depositara em Edgar, isso a enfraqueceria muito, além de exigir muito tempo que ela não tinha.
- O meio mais fácil é recuperarmos o pássaro quando ele voltar e tirar a energia dele. - Concluiu Cameron como se fosse óbvio. - Isso, claro, se aquele mago vil não tiver sugado a energia para ele usar em algum ritual malévolo maligno do mal...
A mente da guerreira-maga elfa, no entanto, já estava entregue às orações e sentia com se lhe viesse agora os vislumbres de um outro lugar.
Talvez fosse o cheiro forte da fumaça dos cogumelos, mas Kaliandra sentiu um pouco como se sonhasse acordada. Não havia mais a voz de Cameron ou dos outros elfos, havia apenas uma bela floresta como em Encontro Eterno. Mas o belo lugar parecia coberto uma névoa rósea e tudo além da beleza física, parecia perdido. Não havia magia, não havia alma, não havia positividade naquele ambiente. Era como uma cópia de cera ou uma bela pintura de um lugar realmente único. O nevoeiro róseo a incomodava e parecia sugar suas forças também, suas magias.
Foi então que seus olhos viram que a névoa se fazia mais densa no centro das árvores. Ali parecia um verdadeiro âmago de toda aquela neblina, mas não conseguia sequer discernir as arvores naquela direção.
Cada árvore que Kaliandra tocava enquanto caminhava parecia pedir socorro em sua mente. Era como se fossem tão antigas quanto o universo e pudessem se expressar pelo farfalhar de suas folhas. Mas a névoa não tinha interesse nelas.. não mais. Cada vez mais próxima do centro, a destemida Boaventura apertava os olhos tentando ver melhor.
Sua forças também iam se exaurindo. Ainda que sua energia vital continuasse sua, assim como a floresta, a perda da magia tirava o que tinha de mais especial. Era como se sua experiência, seu conhecimento e suas potencialidades fossem se esvaindo a cada passo rumo ao âmago da mata. Ainda assim, a elfa perseverou. Seus olhos iam vendo o vulto de uma mulher deitada na relva entre as árvores. Ela já reconhecia Bibiana caída inerte sendo sugada pela fumaça rosa. Kaliandra soltou um brado brandindo sua espada:
- Nefasto ser de névoa, afaste-se de minha deusa ou sentirá minha ira!!! - Então, partiu na direção de Bibiana, golpeando ao redor, para tentar levantá-la. - Oh deusa de todos os elfos, salvarei a ti nem que seja para entregar minha vida!
Os golpes de Kaliandra Boaventura cortavam o ar e a névoa como se nada houvesse para cortar. Suas palavras ecoavam entre aquelas árvores ancestrais sem resposta. Quando alcançou a deusa que tocara seu coração, ela viu o corpo inerte de uma simples elfa. Não era muito diferente dela. A beleza era mediana. Os cabelos pretos curtos na altura dos ombros. Parecia uma simples pessoa qualquer, que caminhava pelo mundo, amava e sentia fome. Não uma deusa.
Quando Kaliandra se abaixou para levantá-la, sentiu faltar a força para se por de pé. A névoa era densa ali e sugava-a com mais intensidade. Seus conhecimentos arcanos lhe diziam que a criatura não poderia matá-la assim, mas podia deixá-la inerte com sua deusa Bibiana Cromiel.
Em um canto de sua mente, ela teve a impressão de ver as coisas como Edgar mais uma vez, o que não se dava desde que ele havia partido. O pequeno pássaro preto também estava envolto pela fumaça rosa que o devorava.
- Edgar, pequeno e agourento companheiro, tente me perdoar... Mas nem tu, nem eu, somos merecedores de poder enquanto nossa deusa perece. - Kaliandra tentou canalizar toda a minha energia mágica, inclusive a de Edgar, para dar à Bibiana um último suspiro mágico.
Sacrificando o que lhe restava de energia, Kaliandra ergueu-se com Bibiana em seu colo. Ela também sentiu Edgar escapar da prisão da névoa, mas sumir de sua mente. A deusa dos elfos não mudou em nada, enquanto o guerreira maga sentia as pernas tremerem. Conseguiu dar mais um passo e as duas caíram rolando na relva.
- Kaliandra!!! - Cameron a chamava e a tinha nos braços, enquanto ela despertava como de um pesadelo terrível. Sentia o corpo fraco e o desalento se apossar do seu peito.
- Cameron, precisamos reunir urgentemente a maior quantidade de elfos. Temos de fazer rapidamente um ritual mágico. É imperioso que nossa energia seja passada para Bibiana. Uma névoa rosa está sugando todos os seus poderes. Estive com ela em sonho, mas não posso dizer se se trata de uma premonição ou de algo que se passou.
Cameron olhava-a fixamente no fundo dos olhos:
- Mas é claro, meu amor... vocês, descansados...
- Parece sério... a nossa energia é de Bibiana - disse Dhyon se colocando de joelhos ao lado do casal.
- Somos todos um só... - repetiram os outros três elfos do templo colocando-se em um círculo de elfos. Cameron também se colocou de joelhos:
- Isso não impedirá que ela continue sendo sugada... precisamos de mais do que isso...
O grupo viu-se cercado pelo diabos barbudos escarlates. Apenas Braad mantinha a linha de frente, mas não duraria muito contra meia dúzia de extraplanares infernais como aqueles. Ainda que Rufus Lightfoot tentasse ajudar com ataques sorrateiros, mantinha-se pequeno e escondido. Ele deixara Azuzu II, que assim como Chuck Norris e Sérgio Reis havia sido tomado pelo medo mágico. Mari'bel e Pena Branca disparavam suas setas, mas os esforços concentrados ainda não haviam vitimado sequer um dos inimigos.
- Derdeil, meu mestre... - tentava comunicar-se Edgar para alertar que a nefasta nuvem rosa sugadora de magia ia em direção de seu mestre. No entanto, o escolhido de Azuth apenas via que o pequeno corvo tomara dois anéis e o livro de magia do catatônico arquimago Eurípedes e os conduzia com dificuldade, voando por fora do palácio.
Derdeil Óphoda estava mais ocupado, no entanto, em que a varinha lhe indicasse onde estava o mythal:
- Qual é o caminho mais curto até o mythal.
- Basta chegar ao corredor e passar ao salão principal do palácio. É lá que sempre este o mythal de Myth Drannor - respondeu o item mágico.
Os diabos barbudos cortavam com suas garras, mas também lançavam magias sobre o monge, queimando-o e tentando deixá-lo imóvel, mas ele resistiu à paralisia. Chuck Norris investiu contra o inimigo que chegou pela porta que ainda restava fechada, já que não era esse que lhe causava o medo mágico. Derdeil Óphodda invocou um turbilhão de água que derrubou alguns diabos, o que abriu caminho e permitiu que a veloz e forte Mari'bel o carregasse para longe da confusão. Pena Branca seguiu disparando suas setas para tentar ajudar o monge, que já estava no limite de suas forças e desferia sequências de golpes. Só então mataram o primeiro inimigo, que se desfez em uma nuvem de enxofre ao tombar.
Rufus preferiu manter-se escondido e seguiu a fada arqueira e o mago de Halruaa até a porta ao final do corredor. Ele abriu a porta antiga, mas que ao contrário das demais não desmoronou. O salão que se abriu diante deles era vastíssimo, com muitas colunas alongadas que faziam-no parecer ainda mais colossal. Porém, não conseguiam ter uma ideia clara das ameaças que poderiam haver ali, uma vez que nada escutavam. Os diabos petralhas conseguiram vitimar o monge Braad. Pena Branca já começava a ser acoçado, colocando Sérgio Reis em dificuldades. O druida Chuck precisou assumir uma nova forma, dessa vez, de um urso selvagem para enfrentar os inimigos e contornar todo o dano que lhe causavam.
Continuaram a luta contra diabos barbudos como podiam. Mari'bel, Derdeil e Rufus adentraram o salão, mas descobriram no centro dele um grande foço, onde haviam apenas os fragmentos estraçalhados do grande mythal de Myth Drannor. Quatro diabretes lêmures cercavam-no e esfregavam-se nele. Aqueles grandes cacos já não pareciam ter qualquer magia, percebeu o mago, quando bolas de fogo vindas não se sabe de onde começaram a cair sobre eles. Rufus conseguiu ver o diabo chifrudo escondido no final do aposento que as lançava, assim como os wights que enviou para reforçar o ataque dos diabos barbudos.
Enquanto isso, na mesma janela por onde haviam entrado, a criatura sugadora de magia voltava a entrar no palácio sendo atraída pela energia que sentira em Derdeil ao saborear a força de seu familiar. Ela espremeu-se pelo espaço, enquanto Edgar preferiu circundar por outra janela e passou a grita para alertar os aliados de seu mestre.
Mari'bel acabou tombando ante a bola de fogo, enquanto que Derdeil só teve tempo de invocar a energia de mythal que animava seus itens mágicos de volta para seu íntimo. No entanto, os diabos o alcançaram antes e também o derrotaram, fazendo-o cair sobre os fragmentos do mythal no poço. Rufus usou da magia de sua capa para prender os mortos-vivos que se avizinhavam numa teia.
Ainda nos primeiros aposentos, Sérgio Reis contou com o apoio de Chuck Norris para darem conta do diabo que os ameaçava, escapando para o corredor e tentando manter-se o mais longe possível da nebulosa ameaça rósea. Pena Branca, no entanto, acabou cercado pelos diabos no aposento, enquanto os três foram alvos de explosões profanas que custavam um tanto de suas vitalidades. Ainda assim, o druida optou por curar o ferido Braad trazendo-o de volta para o combate.
Próximos do mythal, Rufus tentou em vão impedir que um dos diabos barbados terminasse o serviço com Derdeil e Mari'bel, mas seus ataques seguiam pouco impactantes, além de ver que o diabo chifrudo mor vinha voando para lançar algo pior do que as bolas de fogo. O diabo barbudo escarlate coberto de trezes agarrou Derdeil, sorriu como todo caçador diante de sua presa e estava prestes a eliminá-lo para sempre, quando Chuck Norris surgiu em carga carregando Braad aposento adentro. O monge conseguiu agarrar o diabo com maestria, mesmo sendo ferido pelos espinhos peçonhentos. O bardo Sérgio Reis ficou para trás tentando recuperar o caído Pena Branca, detonado pela energia profana infernal, vendo Edgar passar fugindo da fumaça rosa sugadora de magia. A criatura, porém, tinha outro alvo.
O nishruu chegou próximo de Derdeil, que ainda estava inerte no foço cercado pelo quarteto de lêmure e ladeado pelo druida em forma de urso e pelo monge agarrado ao diabo. Ele parou sobre o corpo da fada Mari'bel e em um instante, sugou dela toda a energia do mythal que tinha. Isso pareceu dar nova densidade ao monstro, que expandiu-se em todos os sentidos.
Sem perder tempo, Chuck Norris curou Derdeil, que sem pensar duas vezes transferiu a energia que tinha em si para o maior fragmento do mythal. Isso reativou um pouco do campo mágico do artefato e banhou as ruínas do palácio com as forças protetoras contra extraplanares malignos, banindo dali imediatamente os diabos. O alívio, porém, foi muito curto. No mesmo momento, viram que o nishruu já estava a absorver aquele delicioso campo mágico que também o envolvera.
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